A Marinha do Brasil instalou uma verdadeira operação de guerra para limpar os destroços deixados pelo incêndio na Estação Antártica Comandante Ferraz, em fevereiro do ano passado, e colocar no local módulos emergenciais.
Duzentos homens, sendo cem em terra, trabalham diariamente no processo de desmontagem da antiga estação e construção do Módulo Antártico Emergencial (MAE). O conjunto de contêineres abrigará pesquisadores e militares por um período mínimo de cinco anos, até que saia do papel o projeto do novo complexo brasileiro no continente. A estrutura de alta tecnologia tem um custo estimado de R$ 100 milhões.
O G1 acompanhou uma expedição da Marinha até o local, que começou na segunda-feira passada (4). Os viajantes se reuniram em Punta Arenas, no sul do Chile, de onde os marinheiros, pesquisadores e jornalistas decolaram em um avião Hércules C-130 da Força Aérea Brasileira na última quinta-feira (7), rumo à base militar Eduardo Frei, também chilena, que fica na Península Antártica.
De lá, o grupo de militares e cientistas seguiu com o navio Ary Rongel até a Baía do Almirantado, represamento da água do Mar Antártico cercado por montanhas encobertas de neve e geleiras imensas. Um lago de água salgada banha a área, que é considerada território brasileiro na Antártica. No local, um aglomerado de contêineres brancos e vermelhos é visto entre a paisagem gélida e branca.
Operação de guerra – É só quando o bote conduzido por mergulhadores se fixa nas pedras da praia, com blocos de gelo e ventos que deixam uma sensação térmica de -10º C, que se constata uma verdadeira operação de guerra montada em uma das regiões mais inóspitas do planeta.
Equipamentos pesados voltados para a construção civil – como empilhadeiras, guindastes e outras máquinas – tentam dar uma cara de “reconstrução” em meio aos entulhos de aço retorcido ainda presentes da antiga estação. O incêndio que destruiu boa parte da base matou dois militares.
Mais de 700 toneladas de aço, que formavam os blocos da antiga construção já foram retirados e levados para o navio alemão Germânia, que ronda a baía aguardando novas remessas de lixo. O material deve ser todo enviado de volta ao Brasil a partir do dia 26 de março, prazo final para término da “faxina geral”. A partir de abril, o fim do verão torna impossíveis quaisquer medidas para operar na região.
Barracas como dormitórios – A 31ª Operação Antártica, que está dentro do Programa Antártico Brasileiro (Proantar) começou em outubro passado. Desde então, homens como o capitão Paulo Cesar Galdino de Souza, chefe da operação logística na estação Comandante Ferraz, têm passado noites e dias preocupados em entregar tudo no prazo. Ele conta que a limpeza da área passou por uma série de dificuldades, como a remoção de 60 mil metros cúbicos de neve que encobriam a antiga estação e o frio constante de 1º C – agravado pela sensação térmica de -12º C.
“Demoramos dez dias para limpar a neve da área e tivermos que dormir duas noites em barracas, devido ao mau tempo”, conta o militar, que deve permanecer na estação até meados de abril, quando termina a operação.
Complexo provisório – Os contêineres brancos, trazidos na última semana pelo barco argentino San Blas desde Punta Arenas, no Chile, já começaram a ser montados onde funcionava o heliponto da estação. Até a sexta-feira (8), momento em que a reportagem do G1 estava presente na estação Comandante Ferraz, ao menos cinco contêineres estavam posicionados. No interior deles era possível observar lâmpadas já instaladas e portas divisórias de ambientes.
Até o final de março, 39 “caixas de metal” serão agrupadas e formarão um abrigo provisório que dará continuidade aos trabalhos de pesquisa e observação da região – atualmente parte desenvolvidos de forma improvisada nos navios Ary Rongel e Almirante Maximiano, parte tocados em contêineres que pertencem ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Atualmente, em terra são utilizados espaços que antes abrigavam equipamentos receptores de dados meteorológicos e informações sobre o clima. Mas agora, servem de abrigo para que militares utilizam a internet e o telefone – que funcionam precariamente no local.
Esta movimentação é acompanhada pelos militares e engenheiros Ricardo Ferreira e Carla Costa. Os dois contam que a estação provisória funcionará por um tempo mínimo de 5 anos, até que saia do papel a nova estação, que tem custo estimado de R$ 100 milhões (incluindo todo o processo logístico).
Eles afirmam ainda que uma das preocupações dos engenheiros é interligar o sistema de tratamento de esgoto do MAE. Segundo eles, o objetivo é ter “impacto zero” em relação dos detritos humanos na natureza. Além disso, a água utilizada na estação será coletada de dois lagos existentes na ilha Rei George – local que sedia a estação. “Toda a água consumida deverá ser reutilizada”, explica Carla.
Pegada ambiental – A avaliação do impacto ambiental causado pelo Brasil em Comandante Ferraz está sob a responsabilidade de Marcelo Amorim, coordenador de atendimento a acidentes naturais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama).
Além de analisar o andamento da retirada do entulho, ele tem a função de verificar os danos causados pelo incêndio da estação brasileira à biodiversidade da Antártica. Amorim chegou à estação na última sexta-feira e deve permanecer no local por mais uma semana. Outras duas técnicas do Ibama já estiveram no local realizando levantamentos sobre o assunto.
“Havia muito material químico nos laboratórios da estação. Esses resíduos podem ter escorrido para o mar. Desde outubro nosso pessoal tem ido para a estação com objetivo de avaliar onde os resíduos da antiga estação podem ser colocados e como devem ser procedimentos futuros”, conta Marcelo ao G1.
Ele explica ainda que é cedo para avaliar um dano ambiental na região, mas amostras do solo e da água foram recolhidas e levadas ao Brasil para analisar a possível existência de contaminação.
Custos – A operação de desmonte da estação Comandante Ferraz é custeada pela verba de R$ 40 milhões liberada pela presidente Dilma Rousseff do ano passado. No entanto, o transporte dos módulos emergenciais pelo navio argentino não está incluso. De acordo com Galdino de Souza, o governo brasileiro pagará apenas o combustível gasto pelo navio – número que não foi divulgado pelos oficiais. (Fonte: G1)