Estudo consegue “ligar” capacidade de animal de regenerar cabeça decapitada

Por que um humano não consegue regenerar um membro, enquanto outros animais têm a capacidade de crescer novamente partes do corpo amputadas? Para responder a esta pergunta, três estudos diferentes analisaram o animal que talvez seja o maior símbolo da capacidade de regeneração: a planária, um verme que pode até ser decapitado, que produzirá uma nova cabeça. As pesquisas foram divulgadas nesta quarta-feira na revista especializada Nature.

“As cabeças regeneradas são totalmente funcionais no controle do resto do animal e nossos D. lacteums (uma espécie de planária) ‘resgatados’ são capazes de comer, por exemplo”, diz ao Terra James Sikes, autor de um dos estudos, então na Universidade de Illinois e atualmente na Universidade de São Francisco, ambas nos Estados Unidos.

As pesquisas ocorreram de forma similar: os cientistas estudaram dois tipos de planárias – uma espécie conhecida pela capacidade de regeneração – “nós podemos cortar o verme em 200 partes, que 200 novos vermes vão se regenerar de cada pedaço”, diz Jochen Rink, do Instituto Max Planck, na Alemanha. A outra espécie estudada é conhecida pelo contrário – por não conseguir fazer uma nova cabeça.

​Nos três estudos, os cientistas descobriram que a diferença entre a capacidade de regeneração era basicamente causada pela “comunicação química” entre as células. Os cientistas testaram, então, mudar um gene que comanda um desses sistemas de comunicação na segunda espécie de planária e descobriram que a habilidade dela de regenerar sua cabeça foi “ligada”. Mesmo quando eles cortavam um pedaço próximo à cauda, uma nova planária crescia.

“Nós descobrimos que ao restaurar um único trajeto sinalizante WNT (a comunicação química entre as células) a níveis normais, a regeneração da cabeça pode ser restaurada nesta espécie de planária. Os dois artigos adicionais na Nature mostraram o mesmo efeito em outras duas espécies com regeneração limitada”, diz Sikes.

Os cientistas afirmam, contudo, que não é simplesmente esse sistema de comunicação que diferencia a capacidade das planárias para a de outros animais. “De importância central para as habilidades regenerativas das planárias são as chamadas células-tronco pluripotentes, o que significa que essas células podem se diferenciar em cada e todo tipo de célula do animal. Sua grande abundância e distribuição praticamente uniforme ao longo do corpo da planária garantem que praticamente cada peça que pode ser cortada irá conter células-tronco (pluripotentes) e então o material bruto vai repor tecidos ausentes. (…) Por último, a anatomia das planárias não concentra as funções vitais em um único local. Por exemplo, elas não têm um coração e seus rins se estendem através do corpo plano de forma tal que até um pequeno pedaço de tecido pode sobreviver tempo suficiente para regeneração”, diz Rink.​

Entender a função desse sistema de comunicação na regeneração, por outro lado, pode ter ecos no futuro da medicina. “Isso sugere a existência de fatores antiregenerativos em vertebrados, inclusive humanos, e talvez possa prover uma nova estratégia para elucidar o potencial regenerativo em vertebrados, que têm deficiência regenerativa, ao silenciar fatores que interferem na regeneração de órgãos e tecidos, e assim beneficiar a medicina humana”, diz o autor do terceiro estudo, Yoshihiko Umesono, do Centro Riken de Desenvolvimento Biológico e da Universidade de Kyoto, ambos no Japão.

“Estes vermes perderam a habilidade de regenerar partes dos seus corpos há milhões de anos, mesmo assim, ao manipular apenas um gene, nós conseguimos resgatar a habilidade de crescer novamente sua cabeça. Isto sugere que até pós este longo período, o programa de ‘como fazer uma cabeça’ ainda estava no seu tecido. Uma vez que o sinal correto é dado, esses tecidos conseguem iniciar uma resposta regenerativa completa e aparentemente normal. Apesar de que a restauração da habilidade de regeneração em humanos não deve vir com a manipulação de um único gene, nosso trabalho sugere que a receita para a regeneração ainda está em nós. Se descobrirmos como desbloquear esse potencial, a medicina regenerativa humana terá um potencial ainda maior”, diz Sikes. (Fonte: Terra)