A floresta da Reserva da Biosfera Maia, no norte da Guatemala, tem uma das maiores diversidades de espécies do planeta. Durante séculos, devido à colonização e à ditadura militar, a população que vive na área foi expulsa de suas terras e assassinada. Agora, essa comunidade se tornou especialista em manejo florestal.
A região é uma das poucas no mundo onde a população local administra serralherias e marcenarias de maneira profissional e, em muitos aspectos, moderna. Isso só é possível porque os moradores conseguiram uma concessão, ou seja, a licença para administrar a floresta.
A decisão sobre como a mata é manejada de forma sustentável fica a cargo da população. “A América Central e o México são exemplos de onde as comunidades locais tiveram mais sucesso com a administração florestal comercial e, ao mesmo tempo, sustentável”, afirma Kaimowitz.
A história da virada começou com a Associação de Comunidades Florestais de Péten (Acofop). Em 1986, após o final da ditadura militar no país, havia também apoio internacional aos planos da criação de uma reserva da biosfera na antiga cidadela Maia, em El Petén. Mas a maioria das organizações não-governamentais internacionais queriam que toda a região fosse área de preservação – sem incluir a população indígena.
“Esse é um modelo que funciona talvez nos países ricos. Contudo, um país com grande pobreza e sem chances para as pessoas, precisa proteger a natureza de outra maneira, por meio da utilização sustentável dos recursos”, afirma o presidente e um dos fundadores da associação, Marcedonio Cortave. Ele nunca abandonou a ideia de incluir as atividades dos moradores no plano de conservação.
De perseguidos aos administradores – Carmelita é uma das comunidades desse projeto. A cooperativa no norte de El Petén é composta por 80 famílias, ao todo 380 pessoas. Antes da criação da borracha sintética, sua população vivia da exportação do látex do sapotizeiro. Com a fabricação sintética, os preços e a produção caíram. Até hoje, a pista de pouso de Carmelita lembra o tempo de ouro da vila.
Atualmente, o sustento das famílias da região vem da floresta, principalmente da madeira tropical. Todos os anos, eles cortam de uma a três árvores por hectare. A madeira é certificada com o selo do Conselho de Manejo Florestal (FSC). Além disso, as folhas de algumas palmeiras, também certificadas, utilizadas em arranjos florais, são exportadas para o México e Estados Unidos.
“Um grande sucesso da Acofop é a possibilidade de lucro das comunidades com a floresta. Essa união mostrou que grupos muito pobres podem se desenvolver, através da utilização sustentável de recursos e, assim, melhorar suas condições de vida”, comemora Cortave
Produtos diversificados – O látex do sapotizeiro continua sendo tirado e as folhas de outra palmeira são usadas tradicionalmente como telhado. Uma espécie de pimenta que cresce na floresta também conta como um dos produtos lucrativos da região, além do turismo.
Ao todo a cooperativa administra mais de 50 mil hectares de floresta, 20 mil deles são para a exploração madeireira. Aos poucos, o passado pobre da comunidade vai ficando para trás. Atualmente, os moradores contam com escolas, uma enfermeira e acompanhamento médico para todos os moradores.
Os jovens que querem fazer cursos profissionalizantes nas grandes cidades recebem um apoio financeiro da comunidade. Uma serralheria e marcenaria própria oferecem cursos profissionalizantes e trabalho.
Uma novidade é o turismo na região. Um passeio de cinco dias de mula, dois de ida e dois de volta, leva os turistas até Mirador, uma das ruínas maias mais famosas. Para Carmelita, a concessão da floresta é garantia de sobrevivênvia.
A floresta também lucrou com esse uso. O manejo florestal sustentável se mostrou um ótimo meio contra o desmatamento ilegal. Incêndios são raros nessas regiões. A biodiversidade também ganha com esse manejo, que é contado em ciclos não de apenas um ano, mas de até quatro décadas.
Sucesso sob ameaça – Mas o fim da concessão é a grande ameaça para a comunidade. Os moradores de Carmelita têm medo do futuro: eles ainda não sabem se a licença será renovada pelo governo, depois de 25 anos de administração local. Para Kaimowitz, o projeto de sustentabilidade legal é um desafio não só para cooperativas, mas para a preservação.
“Nós precisamos de uma visão de longo prazo para a proteção dessas florestas. As cooperativas também precisam dessa segurança, para que possam planejar e administrar de maneira correta”, diz o especialista. (Fonte: Terra)