O texto do acordo em negociação na COP 21, a cúpula do clima de Paris, avançou na solução de alguns impasses, mas ainda mantém em aberto os principais pontos de desacordo a travar a negociação.
Uma nova versão do esboço a ser discutida pelos 195 países da convenção do Clima foi divulgada na tarde desta quarta-feira (9) em Paris, e negociadores estão analisando o texto para voltar à negociação.
Em relação ao estágio em que o esboço estava no último sábado, o número de expressões entre colchetes — que sinalizam impasse – caiu de 949 para 367 no esboço de acordo. O documento está agora com 29 páginas, tamanho considerado adequado para um tratado.
Muitos artigos do esboço, porém, ainda estão na forma de opções, que podem ou não sobreviver até o texto final. “As boas opções permanecem, o que falta é sabermos quais vão restar”, afirma Ana Toni, diretora do Instituto Clima e Sociedade, que analisou o texto distribuído nesta quarta-feira (9) em Paris.
Para Carlos Rittl, secretário-geral do Observatório do Clima, não há garantia de que os avanços atingidos até agora estarão no texto-final “O acordo é um pacote e só faz sentido se todos os elementos que significam ambição mais alta estiverem presentes”, afirmou. “Neste momento, há risco de que barganhas entre a quarta-feira e a manhã de quinta produzam um acordo mais fraco.”
Finanças – O artigo sobre financiamento do combate à mudança climática ainda possui muitos colchetes, mas números estão dispostos de maneira mais clara. Há um indicativo de que as nações industrializadas devem se comprometer com o repasse de US$ 100 bilhões por ano para países pobres se adaptarem ao novo clima a partir de 2020 e avançarem no corte de emissões de CO2.
Uma proposta em discussão é que esse valor seja revisto e ampliado a cada 5 anos, o que agrada a países em desenvolvimento que relutam em fazer parte da base de doadores dos fundos do clima. A opção mais consensual ainda preservada no esboço do acordo indica que países em desenvolvimento podem colaborar com outros da mesma condição de maneira voluntária, sem que essa ajuda faça parte da conta dos US$ 100 bilhões.
Revisão – Houve progresso na discussão sobre como as atuais promessas de redução de emissões de gases estufa devem ser revistas no futuro. Alguns países pediam que a primeira revisão fosse só em 2024 e continuasse de 10 em 10 anos, mas prevaleceu a ideia de períodos de 5 anos para aumentar a ambição nos cortes. A primeira rodada de revisões deve ocorrer entre 2020 e 2021, se o texto atual for aprovado.
Até agora, 185 países dos 195 da convenção já entregaram suas promessas de desaceleração das emissões de gases-estufa. Isso está em documentos chamados INDCs (Contribuições Pretendidas Nacionalmente Determinadas), que devem ser anexados ao tratado.
As revisões dessas promessas é importante porque os INDCs atuais não são suficientes ainda para evitar um acréscimo de 2°C na temperatura média do planeta, considerado perigoso.
A menção ao limite de 2°C está de forma mais clara no texto, e ainda há a possibilidade de que se estabeleça um limite de 1,5°C. Esta é uma demanda de nações insulares, muitas delas com território poucos metros acima do nível do mar, que podem ser engolidas pelo aumento do nível do mar caso os 2°C sejam atingidos.
Muitos analistas consideram os 1,5°C um objetivo de cumprir, mas a palavra da ONU sobre isso só deve sair mais tarde. O texto de decisão da COP 21 pede aos cientistas do IPCC que produzam cenários para mostrar como manter temperatura do planeta abaixo do acréscimo de 1,5°C, algo que ainda não está contemplado em detalhe nos relatórios anteriores.
Força legal – Pelo número de expressões entre colchetes nas partes do texto esboço, ainda é difícil saber qual será a força legal do acordo a ser assinado em Paris.
Americanos têm pressionado desde o início do tratado para que o texto-final não seja um que os obrigue a transformar seu INDC em lei. Os EUA prometem reduzir ao menos 26% de suas emissões até 2030, em relação ao que emitiam em 2005.
Muitos dispositivos no texto esboço ainda deixam em aberto se os países “devem” ou “deveriam” cumpri-los. Isso abre caminho para que o acordo de Paris seja um documento híbrido, no qual algumas partes devem ser transformadas em leis nacionais e outras não.
O teor do documento final é que vai definir se ele será um “tratado”, com obrigações claras, um “acordo”, mais flexível, ou uma “declaração”, de pouco efeito prático.
“Para qualquer efeito, o texto que foi colocado na mesa hoje é um tratado”, afirma Thomas Spencer, analista da ONG francesa Iddri (Instituto para Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacional). “Pode ser que esse formato seja o formato final. Resta saber se será um tratado que expressa obrigações claras.” (Fonte: G1)