Após crítica de ministro, governo do AM vai rever lei sobre peixes exóticos

O Governo do Amazonas informou, nesta quinta-feira (2), que vai encaminhar à Assembleia Legislativa proposta de alteração de quatro artigos da Lei nº 4.330, que permite a criação de peixes exóticos nos rios do Amazonas. O anúncio ocorre após o Ministério do Meio Ambiente (MMA) se manifestar contrário à legislação. O Governo Federal classificou a decisão como “mais um episódio de retrocesso na área ambiental do país”.

A Lei, de 30 de maio de 2016, disciplina a atividade de aquicultura no estado e dá outras providências como a possibilidade de barramento de igarapés e autorização de empreendimentos em áreas de preservação permanente quando “de interesse público”. O projeto do Executivo Nº 79/2016 foi aprovado no dia 5 de maio, na Assembleia Legislativa.

Na quarta-feira (1º), as secretarias de Estado do Meio Ambiente (Sema) e da Produção Rural (Sepror) se reuniram para discutir a lei e definiram mudanças. Um documento que pede a reedição da lei foi protocolado na Casa Civil do Estado. A proposta de alteração será enviada na sexta-feira (3) à Aleam. A partir do protocolo, a Casa tem três dias para analisar a proposta.

“Além de desburocratizar, a Lei da Aquicultura tem por finalidade criar segurança jurídica para atração de investidores ao projeto de governo que tem na piscicultura uma das principais atividades para o surgimento de uma nova matriz econômica sustentável alternativa ao modelo atual da Zona Franca de Manaus. Considerando a aprovação da assembleia nas próximas semanas, a lei deve ser sancionada até o final de junho”, informou, em nota, a Sema.

Após a polêmica, o Governo do Amazonas comunicou que a proposta de alteração de quatro artigos da Lei nº 4.330 deve ser encaminhada à Assembleia Legislativa até o final desta semana.

“O Governo do Estado defende iniciativas voltadas à manutenção da biodiversidade de peixes amazônicos e incentiva o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis para o fortalecimento da piscicultura com espécies nativas em áreas antropizadas, objeto da nova Matriz Econômica Ambiental do Estado, atualmente em processo de construção. Também que está sempre aberto a discussões mais amplas com a sociedade com o intuito de ouvir as demandas e sugestões para o fortalecimento da agenda ambiental”, diz um trecho do comunicado.

Segundo o governo, o cultivo de peixes deve ser feito por meio de canal de derivação, observando o volume de água no local especificado e as espécies nativas da região que serão cultivadas, conforme regulamentação posterior.

“Retrocesso” – O Ministério do Meio Ambiente divulgou nota onde criticou a legislação. O órgão diz que as atividades de aquicultura “devem privilegiar a imensa biodiversidade de peixes amazônicos, incentivando o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis ou o manejo das espécies nativas”.

Na nota, o ministro do Meio Ambiente, José Sarney Filho, afirma que a introdução de espécies não-nativas tem induzido “a um complexo processo de degradação dos ecossistemas, de forma comprovada, com vários exemplos ao redor do mundo”.

Leia a nota na íntegra
Às vésperas do dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, foi sancionada uma Lei Ordinária no estado do Amazonas que traz a iminência de mais um episódio de retrocesso na área ambiental do país.

A Lei Ordinária 79/2016 disciplina a atividade de aquicultura no estado do Amazonas e dá outras providências, dentre as quais: a liberação do cultivo de espécies exóticas; a possibilidade de barramento de igarapés; a autorização de empreendimentos em Áreas de Preservação Permanente (APPs), quando de “interesse público”, entre outros.

O Ministério do Meio Ambiente (MMA) não se posiciona contra as atividades de aqüicultura, mas defende que elas devem privilegiar a imensa biodiversidade de peixes amazônicos, incentivando o desenvolvimento de tecnologias sustentáveis ou o manejo das espécies nativas.

O MMA reitera que a introdução de espécies não-nativas tem induzido a um complexo processo de degradação dos ecossistemas, de forma comprovada, com vários exemplos ao redor do mundo, sendo os casos de introdução de espécies de peixes para aquicultura alguns dos mais emblemáticos. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) reconhece que a aquicultura com peixes exóticos deve ser considerada introdução intencional na natureza, mesmo que a manutenção da espécie seja em sistema fechado, devido à facilidade e frequência de escapes.

O cultivo de espécies exóticas gera diversos impactos às nativas, ainda mais se a espécie tiver potencial invasor, como é o caso da famosa tilápia. Isso significa que a invasora compete diretamente com as espécies nativas por recursos (abrigo, alimentação, ninhos, entre outros), podendo levar populações locais de peixes à extinção.

Dessa forma, apesar de a Lei Ordinária ser estadual, os impactos negativos deverão alcançar toda a bacia amazônica, inclusive os demais países, caso ocorram escapes acidentais, e o estabelecimento dessas populações no meio natural sem que haja critérios rigorosos para autorização dos empreendimentos.

A gravidade da iniciativa do governo do Amazonas fez com técnicos do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação da Biodiversidade Amazônica (Cepam/Dibio/ICMBio) se mobilizassem, com demais especialistas e parceiros, no sentido de emitir ressalvas e pareceres técnicos que pudessem subsidiar o governo do estado do Amazonas a não emitir tal ato.

No entanto, as ressalvas e premissas que haviam sido incluídas em uma minuta anterior do referido Projeto de Lei foram eliminadas e o texto foi aprovado pela Assembleia Estadual em 5 de maio deste ano.

Os especialistas repassaram, então, o assunto ao Ministério Público Federal com uma moção no sentido de explicar e alertar os danos irreversíveis que tal lei pode gerar à bacia amazônica como um todo.

Em 30 de maio, o Ministério Público Federal (MPF), juntamente a representantes do ICMBio, Ibama e parceiros locais, estiveram reunidos com o gabinete do Governo a fim de barrar a emissão do ato. Mas, durante a própria reunião, os técnicos foram informados de que o governador já havia sancionado a Lei.

Outra questão preocupante refere-se à possibilidade de barramento de igarapés e outros cursos d’água para aquicultura. O estado do Amazonas está na maior bacia hidrográfica do mundo, com milhares de espécies de flora e fauna que dependem dos ciclos naturais dos rios, tanto nos igarapés (rio contínuo) como nas áreas de várzea (pelo pulso de inundação) e da conectividade destes sistemas.

Diante do exposto, o Ministério do Meio Ambiente se coloca, radicalmente, contra a lei estadual e fará os esforços necessários junto ao governo do estado do Amazonas no sentido de que a Lei Ordinária seja imediatamente revogada, e que se faça, também, uma discussão mais ampla com a sociedade a fim de avaliar as drásticas consequências ambientais da lei estadual. (Fonte: G1)