O juiz da 5ª Vara Federal de Presidente Prudente, Márcio Augusto de Melo Matos, julgou procedente uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e determinou a suspensão dos efeitos decorrentes da 12ª Rodada de Licitações promovida pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em relação à disponibilização dos blocos da Bacia do Rio Paraná, situados na região oeste do Estado de São Paulo, para a exploração de gás de folhelho, também conhecido como xisto, com uso da técnica do fraturamento hidráulico.
Na ação, o MPF apontou potenciais riscos ao meio ambiente, à saúde humana e à atividade econômica regional, além de vícios que nulificam o procedimento licitatório.
A sentença publicada nesta terça-feira (3) também suspendeu os efeitos dos contratos de concessão firmados entre a ANP e as empresas Petrobras, Petra Energia S/A e Bayar Empreendimentos e Participações Ltda. relacionados com a exploração de xisto por meio de fraturamento hidráulico nos blocos da mesma região.
O juiz ainda proibiu a ANP de promover outras licitações de blocos exploratórios na região e de dar prosseguimento ao procedimento realizado na 12ª Rodada, que tenham por objeto a exploração do gás de xisto pelo fraturamento hidráulico, enquanto não houver a realização de estudos técnicos científicos que demonstrem a viabilidade do uso dessa técnica em solo brasileiro.
Da mesma forma, a ANP está proibida de fazer outras licitações enquanto não houver a prévia regulamentação pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), a realização de Estudos de Impacto Ambiental e a devida publicidade da Avaliação Ambiental de Áreas Sedimentares (AAAS), “cujos resultados deverão vincular eventual exploração dos correspondentes blocos, oportunizando-se, adequadamente, a participação popular e técnica, dos órgãos públicos, das entidades civis interessadas e das pessoas que serão impactadas diretamente pela exploração, para que, dessa forma, garanta-se o efetivo controle no uso da técnica, inclusive quanto ao depósito e posterior descarte das substâncias utilizadas no processo de exploração”.
Outra determinação da sentença é para que as empresas se abstenham de realizar qualquer atividade específica de perfuração, pesquisa e exploração de poços, com fundamento nos contratos de concessão firmados, enquanto não forem elaborados os estudos mencionados e não realizado o processo licitatório válido pela ANP.
O juiz também mandou a ANP colocar em seu site institucional e no da Brasil-Rounds Licitações de Petróleo e Gás um aviso sobre a ação civil pública movida pelo MPF.
A sentença, que confirmou uma liminar já concedida anteriormente, anulou a 12ª Rodada de Licitações promovida pela ANP, em relação à disponibilização dos blocos da Bacia do Rio Paraná situados na região oeste do Estado de São Paulo, e os contratos de concessão, “desfazendo-se todos os vínculos entre as partes decorrentes da referida rodada de licitações”.
Fracking
De acordo com o MPF, a extração do gás de xisto se dá pelo processo chamado de fraturamento hidráulico, ou fracking, que fratura as finas camadas de folhelho com jatos de água sob pressão, a qual recebe adição de areia e produtos químicos que mantêm abertas as fraturas provocadas pelo impacto.
Ainda segundo o MPF, a fratura hidráulica é um processo de bombeamento de fluido, por meio de um poço aberto verticalmente, com posterior extensão horizontal, atingindo milhares de metros de profundidade, em face do que a pressão gerada provoca fissuras nas rochas sedimentares e permite a extração do gás natural, que chega à superfície misturado com água, lama e aditivos químicos utilizados no processo.
O Ministério Público Federal destaca que os impactos ambientais causados pela adoção dessa técnica são “incomensuráveis” e, em curto prazo, pode-se verificar a contaminação do ambiente por gás, a contaminação da água e do solo por deposição inadequada de efluentes e resíduos, vazamentos, acidentes com transporte e manipulação de materiais perigosos. Em médio e longo prazos, os riscos citados são a contaminação da água subterrânea e a contaminação de poços próximos por gás metano, que é asfixiante e inflamável, com risco de explosão.
A Procuradoria da República relata que diversos trabalhos científicos indicam que o fraturamento hidráulico causa uma série de impactos socioambientais como a mudança nas paisagens e a contaminação do solo, da água e do ar. Além disso, cita que um parecer técnico emitido pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional de Atividades de Exploração e Produção de Óleo e Gás (Gtpeg), instituído pelo Ministério do Meio Ambiente, aponta insuficiência de elementos para uma tomada de decisão quanto à exploração segura do gás de xisto.
“Havendo dúvida quanto aos riscos associados à atividade do fraturamento hidráulico, e essa dúvida, como visto, sequer é negada pela ANP, a mera inclusão do fracking como objeto da 12ª Rodada de Licitações promovida pela ANP, ainda mesmo como uma expectativa de eventual atividade futura, é inaceitável”, ressalta o juiz Márcio Augusto de Melo Matos.
“Em outras palavras, não é lícito à ANP ofertar a licitantes, que visam ao lucro, mesmo que potencialmente, a possibilidade de exploração de uma atividade cujos danos ao Meio Ambiente não são conhecidos”, conclui o magistrado.
“Portanto, é nula a licitação em sua integralidade, porque concebe a prática do fracking, em afronta a princípios basilares de proteção ao Meio Ambiente, e não há como se preservar a licitação em relação ao restante do objeto, pois a hipótese configuraria flagrante ofensa à lei nº 8.666/93, competindo à ANP promover nova rodada de licitações”, sentencia o juiz.
Outro lado
Em nota ao G1, a ANP informou nesta terça-feira (3), através de sua Assessoria de Imprensa, que “ainda não foi intimada” da decisão judicial.
O G1 também solicitou posicionamentos oficiais às empresas Petrobras, Petra Energia S/A e Bayar Empreendimentos e Participações Ltda. sobre o assunto, mas até o momento desta publicação não obteve resposta.
Seminário
O Comitê da Bacia Hidrográfica do Pontal do Paranapanema (CBH-PP) promove nesta quarta-feira (4), em Presidente Prudente, o Seminário “Cuidando das Águas do Pontal do Paranapanema”. O evento tem início às 8h30 e segue até as 11h30, na sala de cinema “Sebastião Jorge Chammé”, no Centro Cultural Matarazzo, na Vila Marcondes.
Para esta primeira edição, o tema abordado é o uso do “Gás de Xisto”. De acordo com o secretário-executivo do CBH-PP, Sandro Roberto Selmo, o assunto foi escolhido em razão das grandes interfaces entre produção de energia e água, com o Pontal do Paranapanema progressivamente sendo transformado em uma região de produção de energia.
“Entretanto, é fundamental cuidar das águas, para que estas não sejam degradadas e, assim, sejam inviabilizados outros usos, bem como não se agrida a saúde da população”, expõe.
Entre os palestrantes, estão o procurador da República Luís Roberto Gomes e os professores Galileu Marinho das Chagas e Ricardo Hirata. O evento conta com o apoio da Prefeitura de Presidente Prudente, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), do Departamento de Águas e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE), do Instituto Geológico, do Ministério Público Federal e do Centro de Pesquisas de Águas Subterrâneas da Universidade de São Paulo (USP).
Fonte: G1