Livros que podem ajudar a refletir sobre o desenvolvimento sustentável

O norueguês Erik S. Reinert atualmente é professor na Estônia, onde ensina Governança Tecnológica e Estratégias de Desenvolvimento. Mas em toda sua vida acadêmica seu foco sempre foi, essencialmente, o desenvolvimento desigual do mundo. A partir de duas perguntas, que poderiam ser consideradas até inocentes – “Como os países ricos ficaram ricos… e  por que os países pobres continuam pobres” – ele desenvolveu uma obra, homônima às perguntas, que já foi traduzida em cinco línguas e chegou ao Brasil em 2008, editado pela Ed. Contraponto e pelo Instituto Celso Furtado. A indagação de Reinert resultou numa longa pesquisa para a qual diversos autores foram dando subsídios. Não há uma única resposta, mas vários caminhos que podem ir abrindo perspectivas de entendimento.

O livro de Reinert é um dos que, neste ano que está terminando, tem ocupado lugar de destaque na minha estante. Como sempre procuro fazer, quem sabe para sugerir leitura, quem sabe para sugerir presentes, vou pinçar aqui algumas obras que penso serem de importância para atualizarmos os estudos sobre o desenvolvimento sustentável, entendendo esta expressão como algo que difere bastante do conceito de desenvolvimentismo-a-qualquer-custo. Reinert expõe sua teoria levando em conta, sobretudo, a qualidade de vida dos cidadãos, antes de se deixar levar pelos “rendimentos crescentes”.

“A relação entre o modo de produzir e a densidade populacional é tão frequentemente ignorada quanto a relação entre o modo de produzir e a estrutura política. Em ambos os casos, a incapacidade de ligar esses conjuntos de fenômenos reforça nossa ignorância a respeito do que realmente causa a pobreza”, escreve o autor.

Não há como sintetizar as ideias de Reinert, e quem se dispuser a comprar e a ler seu livro vai saber que terá em mãos uma obra didática, profunda, em que são pinçados autores que os atuais economistas se esquecem de visitar, o que torna o livro ainda mais atraente. É fato, para Reinert, que os ventos do progresso sopram apenas para aquelas nações que já têm um alto nível de desenvolvimento. Só isso já pode explicar, em parte, a indagação-título.

A obra de Reinert, embora tenha recebido sempre comentários de louvor pela expressividade e conteúdo, também provoca polêmica, não só entre pensadores neoliberais como entre marxistas. Martin Wolf, jornalista britânico que se especializou em economia, foi um dos que se bateu contra a teoria de Reinert quando este enfatiza que o comércio e o mercado livres privaram os países pobres do desenvolvimento. Reinert acredita ainda que a industrialização é a peça-chave para gerar crescimento, já que este setor é o único capaz de produzir rapidamente e de maneira sustentável. Mas, para ele, isso exige proteção ao comércio e capacidades tecnológicas e gerenciais que os países pobres não têm.

Wolf, no artigo “O crescimento das nações”, usa o exemplo de duas nações – Coreia do Sul e Índia – que usaram proteção e política industrial. Uma saltou da pobreza para a prosperidade, enquanto a outra ficou. Isso demonstraria uma falha na teoria de Reinert.

Na mesma linha de reflexões, outro livro tem me ajudado bastante a ampliar pensamentos. Trata-se de “O mito do desenvolvimento sustentável – Meio ambiente e custos sociais no moderno sistema produtor de mercadorias”, de Gilberto Montibeller Filho (editado em 2004 pela Universidade Federal de Santa Catarina). É a tese do professor brasileiro que se pós-graduou na Universidade de Sorbonne, sempre com foco no desenvolvimento socioeconômico e meio ambiente. Para quem está estudando o tema torna-se quase indispensável, já que Montibeller é um dos que analisa as teorias de autores das correntes de pensamento da economia ambiental sob a ótica dos humanos.

Um dos pontos abordados pelo autor tem a ver com indicadores de sustentabilidade: “Não há uma correlação direta entre riqueza e sustentabilidade e pobreza e insustentabilidade”, argumenta ele, baseado em premissas que levam em conta a depreciação da natureza.

Assim como o livro de Reinert, este também é extremamente didático e traz autores pouco conhecidos, o que, para mim, já é uma indicação. Com Montibeller vai-se descobrir, por exemplo, que a expressão “ecologia humana” surgiu pela primeira vez em 1921 para identificar os processos biológicos, sociais e físicos “que se dão entre os homens e o ambiente em que vivem”. Com a crise ambiental dos anos 60 e 70 esta ciência ganhou impulso.

Na linha filosófica, o “Em busca do real perdido”, do francês Alain Badiou (Ed. Autêntica) ajudou-me a digerir melhor os escândalos de corrupçãonos quais nos vimos mergulhadosaqui no Brasil este ano.

“É bastante curioso que a corrupção cause escândalo, já que poderíamos sustentar que a sociedade está corrompida da cabeça aos pés”, diz ele. Um dos principais sintomas de corrupção é o lucro. “Se ganhar  o máximo de dinheiro possível é a norma, fica difícil dizer que não é verdade que todos os meios sejam válidos”.

Meu colega André Trigueiro, que vem tratando as questões de desenvolvimento urbano e sustentável há uma década na GloboNews, lançou o “Cidades e Soluções” (Ed. Leya/Casa da Palavra), (título homônimo do programa que Trigueiro apresenta) também imperdível nas estantes de pessoas que gostam de entender o mundo de forma ampla. O autor entrevista pessoas fundamentais no debate sobre o tema, como Vandana Shiva, Muhammad Yunus, Achim Steiner e Noam Chomsky, entre outros. Dá ainda algumas sugestões absolutamente práticas e viáveis para quem quer viver no mundo de maneira mais sustentável. Vale muito a pena. No site da revista Eco21, a ambientalista Samyra Crespo faz uma resenha construtiva do livro.

Ainda deste ano, o último livro de Jeffrey Sachs, economista norte-americano especialista em desenvolvimento sustentável, que criou a Rede Global de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável, traz bons debates. Trata-se de “A Era do Desenvolvimento Sustentável” (Ed. Actual), com prefácio de Ban Ki Moon, ex-líder das Nações Unidas.

Basicamente, Jeffrey Sachs acredita nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e que, muito em breve, os 193 países membros da ONU vão adotá-los. A partir desta certeza, o livro busca entender como será esta nova era e suas interações complexas entre sociedade, meio ambiente e economia. Também é didático, mas como se pode imaginar, tem uma perspectiva de ser ferramenta para ajudar os cidadãos desse mundo que virá a tecer de maneira mais sustentável as tramas com as quais precisarão se defrontar.

A lista poderia ser maior, mas não fico a dever aos leitores. Há aqui excelentes chances de boa leitura.

Fonte: G1 Amelia Gonzalez