A uma semana da 24ª Conferência das Partes (COP-24), a conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças do Clima, o Programa das ONU para o Meio Ambiente dá sua contribuição ao debate. Publicado anualmente desde 2010, o Emissions Gap Report acompanha como a humanidade está na caminhada para evitar o aumento da temperatura média do planeta em 2 ºC, ou o mais prudente 1,5ºC, conforme concordaram os países no Acordo de Paris.
A conclusão vai ao encontro com as definições do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas em seu último relatório, mas com detalhes ainda mais alarmantes. Ainda é possível manter o aquecimento global abaixo de 2 ° C, mas a viabilidade técnica de evitar o aumento médio da temperatura em 1,5 ° C está diminuindo.
Isso porque, apesar de alguns esforços concentrados, na escala e urgência do problema que a humanidade tem à frente, estamos fazendo muito, muito pouco para reverter esse quadro. Após um período de três anos em que o volume total de emissões de gases de efeito estufa pararam de crescer, voltaram a aumentar em 2017 a ponto de bater o recorde de milhões de anos atrás, quando a vida humana não era possível.
De acordo com o relatório, as emissões globais atingiram níveis históricos de 53,5 gigatoneladas de CO2 e não apresentam sinais de que vá deixar de subir. Dos 193 países reconhecidos pela ONU, apenas 57 estão no caminho certo na meta de reverter o padrão de emissões. Mas esses representam somente 60% das emissões.
Dos países membros do G20, apenas Brasil, China e Japão estão cumprindo com o que foi prometido no Acordo de Paris. Índia, Rússia e Turquia chegam perto, com projeção de chegar menos de 10% abaixo da meta em 2030. Já Argentina, Austrália, Canadá, República
da Coréia, Arábia Saudita, África do Sul e EUA e os 28 países da União Europeia não estão no caminho de cumprirem o que prometeram.
Vale ressaltar que as promessas do Acordo de Paris não foram de nenhuma forma impostas. Cada país pode prometer o que queria, da forma que queria, fazendo as contas que queria. Assim, se o Brasil se destacou positivamente com promessas de reduções das emissões de forma ao mesmo tempo ambiciosas e realistas, os maiores emissores, como EUA e China prometeram muito pouco, e os EUA nem isso conseguem cumprir.
E, mesmo se cumprissem tudo o que prometeram direitinho, o mundo chegaria ao ano2100 3ºC mais quente, o que na prática transformaria o planeta em um lugar bem menos apto para a sobrevivência humana.
“É importante notar que um país que provavelmente vá atingir seus NDCs (Contribuição Nacionalmente Determinada) com base nas políticas atuais não está necessariamente assumindo uma ação de mitigação mais rigorosa do que um país que não está no caminho certo”, diz o relatório.
“Também pode indicar que a ambição do NDC atual poderia ser melhorada. Segundo o Acordo de Paris, os países são obrigados atualizar regularmente e fortalecer seus NDCs. A avaliação realizada nesta seção é baseada em NDCs atuais, reconhecendo que eles devem ser revisados e deve ser consideravelmente reforçado até 2020 para reduzir emissões globais a níveis consistentes com a limitação global aquecimento abaixo de 2° C ou 1,5° C até 2030.”
Uma atualização pode acontecer a partir da próxima semana, quando representantes de países de todo o mundo vão se reunir na cidade de Katowice, na Polônia, em uma reunião que serve justamente para isso, a COP-24. Para os autores não há dúvida: a ambição das nações devem ser três vezes maior caso se queiramos evitar o aumento da temperatura em 2ºC, e cinco vezes em 1,5ºC.
O relatório do IPCC concluiu que, mesmo se conseguirmos limitar o aumento da temperatura em 1,5ºC, a gente não vai passar ileso. A agricultura perde produtividade, acarretando aumento dos preços dos alimentos, insegurança alimentar e fome. Fortes ondas de calor e inundações costeiras podem obrigar deslocamentos de populações. Mais de 100 milhões de pessoas podem entrar para a pobreza. No entanto, aquecer “somente” 1,5ºC evitariam chegarmos no final do século com 25 milhões de pessoas subnutridas a mais no mundo.
“Se o relatório do IPCC representou um alarme de incêndio global, este relatório é a investigação incendiária”, disse Joyce Msuya, vice-diretora executiva da ONU para o meio ambiente. “A ciência é clara; Por toda a ambiciosa ação climática que temos visto, os governos precisam agir com mais rapidez e urgência. Estamos alimentando esse fogo enquanto os meios para extingui-lo estão ao alcance.”
O oitavo Emissions Gap Report foi preparado por uma equipe internacional de cientistas de renome, avaliando todas as informações disponíveis, incluindo aquelas publicadas no contexto do Relatório Especial do IPCC, bem como em outros estudos científicos recentes. Juntos, debateram caminhos que possam impulsionar a urgênte transição do planeta para uma economia de baixo carbono.
A conclusão, é claro, foi apelar para o bolso. “Quando os governos adotam medidas de política fiscal para subsidiar alternativas de baixa emissão e tributar combustíveis fósseis, eles podem estimular os investimentos certos no setor energético e reduzir significativamente as emissões de carbono”, disse Jian Liu, cientista-chefe do Departamento de Meio Ambiente da ONU.
“Felizmente, o potencial de usar a política fiscal como um incentivo é cada vez mais reconhecido, com 51 iniciativas de precificação de carbono agora em vigor ou programadas, cobrindo cerca de 15% das emissões globais”, continuou Liu. “Se todos os subsídios aos combustíveis fósseis fossem eliminados, as emissões globais de carbono poderiam ser reduzidas em até 10% até 2030. Definir o preço correto do carbono também é essencial. A US $ 70 por tonelada de CO², reduções de emissões de até 40% são possíveis em alguns países”.
Fonte: Revista Galileu