A maioria dos seres humanos tem a opção de se desligar das terríveis reportagens na mídia sobre como as mudanças climáticas estão afetando o planeta. Isso não é tão fácil para cientistas e acadêmicos ambientais, que passam o dia pesquisando as consequências das mudanças climáticas.
Em carta publicada na revista Science em outubro, os biólogos Andy Radford, Stephen Simpson e Tim Gordon, disseram que a destruição da natureza desencadeia “fortes reações de luto” em quem tem forte apego emocional ao tema.
Eles argumentam que os institutos de pesquisa precisam desenvolver estratégias de assistência a seus cientistas ambientais, para ajudá-los a lidar com o “estresse emocional” que têm que suportar durante seu trabalho.
Após a publicação, vários colegas procuraram Radford, que é professor da Universidade de Bristol, dizendo-se reconfortados com as avaliações divulgadas. A DW falou com três especialistas que abriram mão da carreira acadêmica, optando pelo ativismo ambiental.
“Minha atração pela ciência sempre foi emocional. Mas na ciência você tem que manter as emoções sob controle, pois são indesejadas na profissão”, revela Wolfgang Knorr, de 53 anos, ex-pesquisador de ciências do ecossistema da Universidade de Lund, na Suécia.
Ele pediu demissão do cargo em setembro passado, depois de 27 anos na profissão: “No nível emocional, tenho uma forte sensação de que há um tremendo risco por aí, e sabemos muito menos do que fingimos saber.” Ele acredita que suas habilidades seriam melhor aproveitadas no ativismo ambiental, mas ainda não sabe que rumo dará a sua vida profissional.
“Em 2005 entrei para o Conselho de Pesquisa em Meio Ambiente do Reino Unido. Diariamente eu participava de reuniões, debatendo novos esquemas de energia renovável ou coisas do gênero. Ao voltar para casa, no trem, eu lia notícias sobre mudanças climáticas, mas a próxima página do jornal apresentava notícias econômicas sobre expansão e crescimento do PIB. Naquele momento, ficou claro para mim que havia uma dicotomia entre o meu trabalho e o que está acontecendo no resto do mundo.”
Ele lembra que sua intuição da época o acompanhou de forma latente até os protestos pelo clima começarem maciçamente. “Eles me fizeram perceber que eu tinha potencial para ser um defensor da causa. E ganhei uma nova perspectiva sobre o que poderia fazer com essas habilidades. Espero encontrar novos usos para as aptidões que usei como cientista e utilizá-las melhor.”
A cientista Jess Spear, de 38 anos, deixou a ciência climática em 2013 para trabalhar numa campanha na cidade americana de Seattle, que elegeu seu primeiro vereador socialista em um século. Ela se mudou para Dublin, Irlanda, em 2017 e trabalha para um novo grupo de esquerda irlandês chamado Radical Internationalist Socialist Environmentalist (Rise).
“Eu trabalhava para o Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS). É muito mais fácil ser uma cientista que trabalha como funcionária pública. Não era tão estressante e era gratificante. Mas na verdade não era o que eu queria produzir no mundo.”
Ela conta que no início de 2011 começou a se decepcionar, pois não via muita gente realmente preocupada com o clima. “Ver os constantes aumentos de emissões e os fracassos dos governos é como assistir a um trem prestes a cair do precipício em câmera lenta. Você sabe o que vai acontecer. Você se sente impotente para fazer algo quando é apenas uma pessoa.”
Ao começar a atuar como ativista, em 2013, Jess sentiu como se uma luz tivesse se acendido: “Foi um momento que mudou minha vida, pois me abriu possibilidades para sair da busca por soluções para me focar em ativismo comunitário.”
O construtor, educador e ativista comunitário francês Mathieu Munsch, de 30 anos, diz que deixou um doutorado em mudança climática na Universidade de Strathclyde, Escócia, em setembro de 2018, depois de dois anos e meio. Hoje, está construindo uma casa ecológica na zona rural da França e se envolveu na política local.
Ele sentiu que se continuasse na carreira acadêmica entraria em conflito com seus valores, enquanto alguém que se preocupa com o meio ambiente. “A Strathclyde tem um grande departamento de engenharia que faz pesquisas sobre fracking e recebe fundos da indústria do petróleo. Os fundos de aposentadoria de professores dos meus departamentos são investidos em combustíveis fósseis”, revela.
No primeiro ano, Munsch ainda acreditava estar fazendo a coisa certa, mas foi ficando cético à medida que o tempo passava. “Ficou cada vez mais óbvio para mim que eu nunca seria capaz de ter uma carreira de sucesso, acesso a uma aposentadoria e tudo mais se não me beneficiasse do sistema econômico atual, que é uma causa dessas mudanças climáticas catastróficas. Era um alerta de que eu precisava sair desse sistema.”
Então sofreu de uma espécie de esgotamento profissional: “Especialmente quando ficava oito horas do meu dia ao computador, lendo documentos sobre a mudança climática. Era emocionalmente pesado, embora eu não ache que fosse o profundo desespero que sei que alguns sentem”, ressalva.
“Algo que me ajudava era atuar em grupos de ativistas. Mas é sair e encontrar uma maneira completamente diferente de fazer coisas que me ajudou a superar o estresse e a exaustão.” Hoje, muitos o parabenizam pela decisão: “Um me disse: ‘Eu fiz exatamente a mesma coisa dois anos atrás, e sinto que o que estou fazendo agora tem muito mais sentido.'”
Fonte: Deutsche Welle