Após tigre e gato doméstico serem infectados pelo novo coronavírus, especialistas avaliam transmissão da doença entre humanos e outras espécies
Uma tigresa que vive no Zoológico do Bronx, em Nova York, nos Estados Unidos, testou positivo para a Covid-19. Além dela, outros seis felinos de grande porte estão sob suspeita da infecção pelo novo coronavírus. As autoridades acreditam que os animais tenham sido infectados por um funcionário assintomático do zoológico, mas pretendem realizar pesquisas mais a fundo para compreender como pode ter sido a contaminação.
A transmissão não é tão óbvia por um motivo: a maior parte dos vírus é “especialista”, ou seja, atinge uma única espécie. Entretanto, às vezes mutações no material genético desses microrganismos permitem que eles “saltem” de uma espécie para a outra — e é exatamente isso que os pesquisadores acreditam que tenha acontecido com o Sars-CoV-2.
“O novo coronavírus, que surgiu em Wuhan, na China, em novembro, não é exatamente ‘novo’. O vírus evoluiu por um longo período, provavelmente milhões de anos, em outras espécies — as quais ele ainda afeta”, explica Steve Wylie, professor da Universidade de Murdoch, na Austrália, em um texto publicado no The Conversation. “Sabemos que o vírus tem parentes próximos em morcegos e pangolins — que são considerados uma iguaria na China.”
Muitas vezes, para que esses microrganismos consigam afetar os humanos, um vetor é necessário, ou seja, as pessoas precisam entrar em contato com os animais que são hospedeiros originais do microrganismo. De acordo com os especialistas, a globalização e o consumo de carne, leite, ovos e outros produtos de origem animal contribui para “saltos” como o do novo coronavírus.
“À medida que ultrapassamos os limites dos lugares selvagens da Terra — criando fazendas e plantações —, vírus da vida selvagem interagem com culturas, animais e pessoas”, escreve Wylie. “Os seres humanos também estão aquecendo o clima. Isso permite que certas espécies expandam sua faixa geográfica em zonas anteriormente frias demais para serem habitadas. Como resultado, muitos vírus estão encontrando novos hospedeiros pela primeira vez.”
Os especialistas acreditam que foi justamente esse contato entre humanos e animais selvagens que permitiu a infecção dos felinos no Zoológico do Bronx. Enquanto alguns pesquisadores tentam ajudar os espécimes a se recuperarem da infecção, outros se preocupam com a saúde de um outro grupo: os primatas.
“Os grandes símios compartilham cerca de 98% do DNA humano e também compartilham suscetibilidade a vários patógenos humanos”, disse Lesley Elizabeth Craig, professora da Universidade Stirling, no Reino Unido, em texto do The Conversation. “Durante a epidemia do vírus Ebola, entre 1994 e 2003, na África Central, foram realizadas pesquisas em animais selvagens em duas áreas do Gabão, antes e depois do surto. Entre as duas pesquisas, as populações de gorilas e chimpanzés nas áreas diminuíram de 90% a 98%.”
A pesquisadora acredita que, embora nenhum caso de Covid-19 tenha sido relatado em grandes símios, o histórico da transmissão de doenças entre esses animais e humanos é o suficiente para causar preocupação. “Devemos assumir que a transmissão é provável e são necessárias medidas rigorosas para evitá-la’, pontuou Craig.
Poucos dias após o caso virar notícia, uma equipe do Instituto de Pesquisa Veterinária Harbin, na China, descobriu os gatos são altamente suscetíveis à Covid-19. Segundo o estudo, publicado pelos pesquisadores no BioRxiv, os felinos podem transmitir a doença uns aos outros por gotículas respiratórias. Por outro lado, espécies de cães, galinhas, porcos e patos testadas foram consideradas improváveis de contrair a infecção.
Tendo tudo isso em vista, a Associação Mundial de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais (WSAVA) destaca em comunicado que “atualmente não há evidências de que animais de estimação possam ser uma fonte de infecção para as pessoas”. Os casos observados em pets até então ocorreram pelo caminho inverso: donos contaminados pelo Sars-CoV-2 acabaram infectando seus animais de estimação.
Já a recomendação para quem está doente é evitar o contato com animais desconhecidos, e sempre lavar as mãos antes e depois de interagir com os pets. “Se você está doente com a Covid-19, evite o contato com animais em sua casa, incluindo acariciar, aconchegar, ser beijado ou lambido e compartilhar alimentos”, aconselha a WSAVA. “Se você precisar cuidar do seu animal de estimação ou ficar perto de animais enquanto estiver doente, lave as mãos antes e depois de interagir com eles e use uma máscara facial.”
Fonte: Revista Galileu