O que se deve fazer com velhos discos rígidos de computadores quando eles chegam ao fim de sua vida útil?
Se dependesse de Allan Walton, partes deles seriam usadas para ajudar a movimentar carros elétricos.
O professor da Universidade de Birmingham é diretor da empresa Hypromag, que extrai e recicla ímãs de neodímio presentes em discos rígidos.
O neodímio é um metal de terra rara – um elemento químico que é considerado um ingrediente essencial em muitas das tecnologias que usamos hoje, como smartphones e televisões. O neodímio é usado, entre outras coisas, para produzir ímãs que fazem os motores de carros elétricos girarem.
Walton acredita que nos próximos dez anos sua empresa poderá estar reciclando neodímio suficiente para atender a um quarto da demanda britânica – que hoje é quase toda suprida por importações da China.
Carros elétricos são geralmente tidos como mais ecológicos do que os que usam motor de combustão interna. Isso pode até ser verdade na comparação com carros prontos, mas quando se fala na fabricação de carros elétricos – que envolve a produção de ímãs com metais de terra rara – eles não são nada ecológicos.
Lago tóxico
Os processos usados para refinar terras raras usam os mesmos químicos encontrados em limpadores de fogão e cosméticos, mas os resíduos produzidos podem ser destrutivos se não controlados propriamente.
Em um local de mineração, em Bayan Obo, na Mongólia, os resíduos formaram um grande lago tóxico. Perto da mina existe uma barragem usada para estocar os resíduos.
Indústrias como a de aço e alumínio já têm programas de reciclagem com capacidade de reduzir o processamento químico. No entanto, no caso de minerais de terra rara existe pouca reciclagem.
Há quatro anos, o professor Walton e seu mentor, o professor Rex Harris, descobriram que o uso de gás de hidrogênio em discos rígidos faz com que os ímãs se esfarelem, permitindo que eles sejam colhidos e remontados, formando novos ímãs.
Esse processo não só é mais ecológico como pode ser bastante rentável.
Este ano a Hypromag pretende anunciar um acordo com a fabricante britânica de carros Bentley.
Ela recebeu um aporte de 2,6 milhões de libras (cerca de R$ 17 milhões) do órgão britânico de apoio a inovações Innovate UK e meio milhão de libras (R$ 3,2 milhões) de uma mineradora africana, a Mkango.
No entanto a solução da Hypromag só atende a uma fração da demanda crescente por terras raras. Algumas estimativas indicam que essa demanda pode dobrar até 2025.
Walton acredita que se o Reino Unido agir agora, o país poderá ser um líder global em reciclagem de terras raras.
O ‘novo petróleo’?
A oportunidade é grande, com a chegada de tecnologias como 5G demandando muitos minerais, além de toda a indústria já existente de telefones, microprocessadores e turbinas de vento.
No entanto, um dos principais motivos pelos quais algumas pessoas comparam terras raras a petróleo é o crescimento enorme da indústria de veículos elétricos.
Depois de 2025, a Holanda tem como meta não vender novos carros movidos a combustíveis fósseis. O Reino Unido e a França prometeram atingir esta meta até 2040. Neste ano, a China quer que 12% dos carros vendidos sejam de emissão zero.
A China é a líder mundial na produção de terras raras e de ímãs feitos a partir delas. O motivo disso é que a China consegue extrair e produzir tudo localmente. É o único país capaz de fazer isso. Mais de 70% dos produtos com terras raras no mundo são exportados pela China.
Sua cadeia de suprimento produz preços que ninguém consegue bater. Terras raras são componentes importantes no plano Made in China 2025, para estabelecer o país como líder industrial mundial.
Apesar disso, a China não possui tipos mais pesados de metais raros, que são os que estão em maior demanda agora, como neodímio.
A China importa a maior parte do seu neodímio de Mianmar e dos Estados Unidos, segundo Christopher Ecclestone, que é estrategista de mineração da empresa Hallgarten.
A mina de Mountain Pass, na Califórnia, vende 100% de suas terras raras concentradas para a China – e a mina é em parte propriedade da chinesa Shenghe Resources, que possui 9,9% das ações.
“Os Estados Unidos são uma das maiores fontes de terra rara para a China, e os chineses estão comprando tudo quase de graça. Isso está enlouquecendo o Pentágono”, diz Ecclestone.
O que colocou a China em uma posição de domínio nesse mercado foi o fato de que as terras raras são um subproduto de minas já estabelecidas, diz Ian Higgins, que é diretor da empresa britânica Less Common Metals.
A companhia é uma das únicas produtoras fora da China que combina terras raras para formação de ligas. Ele diz que as minas chinesas são financiadas com subsídios governamentais e práticas obscuras de contabilidade.
Mesmo com a melhora nas políticas ambientais chinesas, muitas dessas grandes minas foram construídas antes da implementação de novas regras.
“Existe muito processamento de terras raras que ainda é horrível e existe muito mercado negro para contrabando de terras raras mais pesadas”, diz Higgins.
Mas ele diz que o país está finalmente acordando para o impacto ambiental dessa indústria.
A pandemia de coronavírus fez com que a linha de produção global parasse subitamente. Mas isso também ajudou produtores a questionar as cadeias de suprimento global e a forma como todos dependem apenas de um país para obter terras raras.
Os Estados Unidos, o Reino Unido e a Europa estão tentando construir suas cadeias de suprimento.
No dia 13 de maio, um projeto de lei com previsão de benefícios fiscais foi apresentado nos Estados Unidos – com algo na ordem de US$ 50 milhões (R$ 260 milhões) de financiamento para novas minas americanas.
Na Europa, o fundo Horizon 2020 tenta estabelecer uma cadeia de suprimento em diversos países.
Fonte: BBC