Ainda aumentando, a população global poderá chegar, segundo estimativas, a 10 bilhões de pessoas em 2050. Para alimentar tanta gente, vamos precisar produzir uma quantidade recorde de alimentos.
A dimensão desse desafio é épica. Com apenas 30 temporadas de plantio e colheita restantes até que a população atinja o marco de 10 bilhões, fica claro que a agricultura como conhecemos hoje precisa mudar, se quisermos ter esperança de alimentar o planeta.
Nos últimos seis meses, viajei por toda a Europa conversando com cientistas e engenheiros, formadores de opinião, varejistas e, é claro, agricultores na tentativa de analisar uma série de questões em torno do abastecimento de alimentos e encontrar soluções em potencial para o nosso futuro.
Essa transformação tão necessária – não apenas da agricultura, mas de toda a nossa cadeia de suprimento de alimentos – já está em andamento.
Confira abaixo cinco sugestões que podem ajudar a nos preparar para alimentar os futuros 10 bilhões de habitantes do planeta:
1 – Criar ‘robôs fazendeiros’
Antes de começar a reclamar que os robôs estão roubando nossos empregos, me ouça. Muitos agricultores dizem que o trabalho no campo, sentado por horas a fio em um trator, não só é repetitivo e chato, como toma tempo que eles poderiam estar investindo em outras tarefas importantes que precisam desempenhar para gerenciar seus negócios.
A Small Robot Company criou três pequenos robôs: Tom, Dick e Harry. Tom tira fotografias com georreferenciamento de plantas no campo, que são enviadas para análise. Isso faz com que Dick se aventure a pulverizar – com precisão – plantações específicas, eliminando assim a necessidade de pulverizar os campos como um todo, o que evita o uso desnecessário de poluentes e economiza recursos. Harry é o robô de plantio, equipado com uma furadeira robótica.
Juntos, eles realizam tarefas monótonas tradicionalmente realizadas pelo homem – com maior precisão e menos desperdício.
2 – Preservar o solo
Um dos motivos pelos quais robôs móveis de pequeno porte podem ser uma boa notícia para a agricultura é que eles conseguem substituir boa parte do trabalho realizado pelos tratores convencionais.
Os tratores comuns são pesados. Quando atravessam o campo, compactam o solo. E “esmagam” os poros que existem no interior da terra, reduzindo o tamanho dos orifícios que retêm a água e o ar.
Essa compactação afeta significativamente a capacidade do solo de reter água e, portanto, a capacidade da plantação de absorvê-la, juntamente com os nutrientes.
O uso de robôs menores e mais leves para realizar o trabalho executado atualmente por tratores pode ajudar bastante a reduzir esses problemas.
É verdade que um robô de pequeno porte não é capaz de arrastar máquinas grandes e pesadas, como um motocultivador. Mas eles não pretendem simplesmente repetir os métodos da agricultura tradicional.
3 – Evitar o desperdício
Um dos fatos mais chocantes que aprendi foi em relação à enorme quantidade de alimento em bom estado para consumo que é desperdiçada.
De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), “um terço estimado de todos os alimentos produzidos acaba apodrecendo nas latas de lixo dos consumidores e varejistas, ou estragando devido a práticas inadequadas de transporte e colheita”.
Um dos países que enfrentam um grave problema de desperdício é a Holanda, um grande exportador de produtos agrícolas (em valor). A magnitude da circulação de alimentos pelo país faz com que o desperdício seja uma questão importante. O governo prometeu que a Holanda se tornaria o primeiro país europeu a reduzir pela metade a quantidade de alimentos descartados até 2030.
Há uma série de ideias e iniciativas brilhantes para ajudar a resolver esta questão, mas uma abordagem que acho sensacional é o uso de aplicativos como o “Too Good To Go” (ou ”bom demais para se jogar fora”, em tradução livre). Esse aplicativo permite que os varejistas vendam alimentos que seriam descartados – mas estão em perfeita condição de consumo – para os clientes a um custo reduzido.
4 – Retardar o processo de amadurecimento
Não podemos voltar no tempo, mas, pelo menos quando se trata de frutas, é possível retardar o processo de amadurecimento.
As bananas que como na minha casa, no Reino Unido, podem ter vindo do Equador, da República Dominicana, da Costa Rica ou de outro lugar ainda mais distante.
Para chegar até a minha geladeira, elas devem ter sido colhidas ainda verdes, talvez tenham passado 40 dias em um barco até chegar ao supermercado, onde, para serem escolhidas na prateleira, precisam estar perfeitamente amarelas, sem qualquer mancha preta ou marrom. Isso requer um gerenciamento incrível e cuidadoso.
Se uma banana amadurece cedo demais no meio desse processo, ela libera gás etileno, o que desencadeia o amadurecimento de outras bananas. Basta uma única banana fora do padrão para acabar com 15% de um carregamento. É uma pilha enorme de bananas desperdiçadas.
O que alguns cientistas de Norwich, no Reino Unido, estão fazendo é editar o genoma das bananas – modificando letras específicas em seu DNA – para que produzam muito menos etileno.
A iniciativa pode reduzir o desperdício durante a viagem e prolongar sua vida útil no supermercado. Em algumas partes do mundo, poderia ser reproduzido em cadeias de suprimento reais.
Mas em outros lugares, como na União Europeia, a edição genética das plantações tem uma regulamentação rigorosa e passa por um longo processo de aprovação.
5 – Fazer escolhas mais inteligentes
Passando um tempo com agricultores, produtores, varejistas e consumidores, percebi rapidamente como nossas formas atuais de cultivar, processar e vender alimentos não são escalonáveis ou sustentáveis.
A única maneira de alimentar 10 bilhões de pessoas até 2050 é se as indústrias agrícolas e alimentares se tornarem muito mais sustentáveis. E isso requer mudanças em todo o modelo de cultivo, processamento, transporte, armazenamento e venda. Significa que muitas empresas e governos precisam agir. Mas todos nós também.
Seja indo ao mercado e escolhendo os legumes mais “feios” para o jantar, incentivando os supermercados a mudarem os rótulos para informar a pegada de carbono e hídrica de cada alimento (para que você possa fazer uma escolha consciente) ou usando novas tecnologias para evitar o desperdício, há muito que podemos fazer para valorizar nossos alimentos e seus produtores.
Construir um mundo que vai se alimentar de uma agricultura sustentável é uma tarefa difícil. Mas agricultores, cientistas, engenheiros, varejistas, líderes empresariais e governos estão se unindo para garantir que haja comida suficiente no futuro. E eu certamente estarei pensando nas mudanças que posso adotar do ponto de vista individual para participar deste esforço.
* Greg Foot é apresentador da série de TV ‘Follow the Food’ da BBC. Este artigo representa as visões e reflexões pessoais dele.
Fonte: BBC