Encontrar um sabiá-laranjeira por aí não é uma cena tão rara. Agora, flagrar uma ave da espécie com leucismo e ainda fazendo um ninho, aí já é sorte grande demais.
Foi o que aconteceu há poucos dias com o fotógrafo e produtor audiovisual Guilherme Andrighetto, em Curitiba. “Tenho um projeto pessoal para realizar uma biografia das aves e escolhi começar pelo sabiá-laranjeira, até pela facilidade de encontrar a espécie. Estava no Parque Estadual Bosque do Papa para coletar imagens quando a sabiá branco passou por mim”, conta.
A surpresa de ter visto a ave com leucismo foi ainda maior quando, depois de segui-la com os olhos, a observou levando galhos para o ninho que estava construindo.
“Sempre ouvi falar, mas nunca tinha visto uma ave inteira leucística, só arlequim. Além disso, agora posso acompanhar o ninho, o que está sendo um privilégio”, diz.
O leucismo é resultado de uma mutação genética que causa perda total ou parcial de melanina nas penas, que é o pigmento responsável por cores como o marrom e o preto.
“O leucismo afeta principalmente a coloração das penas sendo muitas vezes restrito a partes específicas do corpo (arlequinismo). Já no albinismo, por exemplo, além das penas, bico, patas e olhos também são afetados pela ausência total de produção de melanina e de carotenóides”, explica Luciano Lima, biólogo especialista em aves.
No leucismo, os olhos mantêm a pigmentação normal e não são fotossensíveis, enquanto no albinismo os olhos não possuem coloração e acabam assumindo tons vermelhos dos vasos sanguíneos.
“Fico a uma distância de cerca de 40 metros para não interferir nas atividades dela, mas ela está bem tranquila e completamente integrada, fica ciscando com os outros. Passa por mim sempre para coletar mais material para o ninho”, comenta Guilherme.
Luciano Lima explica que o fato de ter as penas brancas pode representar um risco maior à ave.
Um sabiá predominantemente branco como este está mais exposto a predadores por conta da coloração menos discreta. Além disso, a falta de melanina nas penas tende a deixá-las mais frágeis. Por estas razões, as chances de uma ave leucística atingir a idade adulta e conseguir se reproduzir é provavelmente menor que de um indivíduo normal— Luciano Lima, ornitólogo
A expectativa maior agora é ver o ciclo reprodutivo da ave se completar. “Tento ir até o local várias vezes por semana para quem sabe filmar a cópula e conseguir observar possíveis ovos. Por essa sabiá ser leucística, eu consigo diferenciá-la das outras e ter a certeza que estou observando sempre a mesma ave. O que faz eu aprender mais sobre o comportamento e sobre o ciclo dela”, conta Guilherme.
De acordo com Luciano Lima, há chances dos filhotes nascerem com a mesma mutação da mãe: “Por ser um fenômeno com base genética, é possível sim ser uma característica que seja herdada também por algum filhote”, finaliza.
Paixão pelas aves
Com mais de 70 mil registros em cinco anos e quase 500 espécies fotografadas, Guilherme, de 36 anos, detém um acervo recheado, principalmente da avifauna sulista do Brasil.
Apaixonado pela natureza desde a infância, a chegada da filha em 2003 incentivou a compra de uma câmera digital importada que transformou a observação dos animais, das flores e das paisagens de Florianópolis e Curitiba em fotografias.
O hobby cresceu tanto que a profissão de engenheiro ficou para trás e o dia a dia como fotógrafo e produtor virou rotina. “Brinco que nós que trabalhamos com fotografias e vídeos de natureza somos caçadores modernos. O processo para atrair os animais é o mesmo, com muito trabalho e estratégia, mas o que muda é que nunca capturamos de fato os bichos, só imagens deles”, conta.
Fonte: G1