O ornitorrinco é uma das criaturas mais estranhas do planeta em diversos aspectos. Embora sejam mamíferos, esses nativos australianos botam ovos e exibem espinhos venenosos nas patas traseiras. Eles também têm cauda de castor e bico de pato, utilizado para detectar a presa durante caçadas noturnas, que realizam com os olhos fechados.
Agora, os cientistas constataram outra característica estranha que se soma à lista: pelos fluorescentes.
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Em um recente estudo publicado na revista científica Mammalia, os cientistas descobriram que quando iluminados por luz ultravioleta (UV) — um espectro de luz não visível ao olho humano — a pele dos ornitorrincos emite um brilho azul-esverdeado.
“Fiquei um pouco surpresa ao [ver] que o ornitorrinco é biofluorescente”, afirma a autora principal do estudo, Paula Anich — especialmente porque já é “um animal peculiar”.
A constatação expande o conhecimento da ciência sobre biofluorescência, que os pesquisadores descobriram ser mais difundida em todo o reino animal do que se pensava anteriormente.
“Isso acrescenta outra observação de que muitos animais são biofluorescentes e abre questões sobre o que o fenômeno pode significar para a espécie, caso haja algum significado”, afirma David Gruber, explorador e pesquisador da National Geographic que estuda fluorescência em criaturas marinhas e que não participou do estudo.
De esquilos-voadores a ornitorrincos
Biofluorescência é o fenômeno pelo qual uma substância, como o pelo, absorve luz em um determinado comprimento de onda e a emite em um comprimento de onda diferente. Os tons biofluorescentes comuns incluem verde, vermelho, laranja e azul.
Apenas nos últimos anos, os cientistas constataram que diversos tipos de cascos de tartarugas-marinhas, fungos e esquilos-voadores são biofluorescentes. Embora as razões sejam desconhecidas, as hipóteses incluem camuflagem ou comunicação entre indivíduos da mesma espécie.
Em 2019, Anich, mamologista da Northland College em Ashland, Wisconsin, e seus colegas constataram que esquilos-voadores fluorescem sob a luz ultravioleta, emitindo um brilho rosa dos pelos da barriga.
Esses estudos levaram a equipe ao Museu Field de História Natural em Chicago, onde os pesquisadores iluminaram com luz ultravioleta peles de esquilo preservadas. Por curiosidade, eles fizeram o mesmo com um espécime de ornitorrinco armazenado lá — e observaram o brilho.
Pouco antes de o estudo de Anich ser publicado, outro artigo de pesquisa relatou que um ornitorrinco que havia acabado de morrer em uma estrada na Austrália brilhava sob uma luz negra, uma lâmpada que irradia luz ultravioleta.
Isso valida a descoberta de Anich e mostra que é muito provável que ornitorrincos vivos, não apenas os mortos há muito tempo, sejam fluorescentes, declara Gilad Bino, especialista em ornitorrincos da Universidade de Nova Gales do Sul em Sydney, na Austrália.
“Os ornitorrincos nunca param de me surpreender”, afirma Bino sobre a nova publicação científica, da qual não participou.
Qual seria a finalidade?
Ainda não está claro por que os ornitorrincos brilham.
De acordo com Anich, como os animais são noturnos e mantêm os olhos fechados ao nadar, parece improvável que o brilho desempenhe um papel importante na comunicação com outros ornitorrincos.
Ainda segundo ela, pode ajudá-los a evitar certos predadores capazes de enxergar a luz ultravioleta; absorver radiação ultravioleta e emitir luz azul-esverdeada pode servir como uma forma de camuflagem.
Bino concorda que a teoria seja plausível. Muitos animais, incluindo a maioria das aves, são capazes de enxergar na radiação ultravioleta. Dentre os predadores nativos do ornitorrinco estão peixes grandes como o bacalhau-de-murray, aves de rapina e dingos.
Também é possível que a característica não tenha uma função real — que seja apenas uma peculiaridade ancestral mantida pelo ornitorrinco além de suas outras características primitivas, como postura de ovos.
Tanto Anich quanto Bino afirmam que esperam estudar um ornitorrinco vivo para confirmar a constatação da biofluorescência e talvez aprender mais sobre sua função.
“Após essas constatações”, afirma Bino, “com certeza vou comprar uma fonte de luz ultravioleta para minha próxima pesquisa de campo”.
Fonte: National Geographic Brasil