O deputado Geninho Zuliani (DEM-SP), relator da chamada medida provisória (MP) da vacina, confirmou nesta terça-feira (15/12) que vai incluir em seu relatório um dispositivo para que as pessoas que tomem imunizante contra covid-19 assinem um termo de consentimento.
A ideia foi sugerida pelo presidente Jair Bolsonaro na segunda-feira. O objetivo é isentar a União de responsabilidades por eventuais efeitos colaterais. A medida valeria para todos os imunizantes registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), tanto em caráter emergencial quanto em definitivo.
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“É uma grande preocupação do presidente, que também é nossa, quanto à responsabilidade civil do governo federal”, disse Zuliani, após reunião com Bolsonaro nesta terça. A medida gerou espanto entre epidemiologistas e outros especialistas em vacinas. Alguns acusaram Bolsonaro de desacreditar a vacinação.
Nada similar foi adotado por países que já começaram a imunização contra a covid-19. Segundo o site G1, ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já adiantaram que qualquer iniciativa nesse sentido deve ser barrada.
Segundo Zuliani, a ideia foi resultado do contrato de compra de vacinas que a empresa Pfizer ofereceu ao governo. Segundo ele, os termos eximem o laboratório de responsabilidade. Dessa forma, o governo quer repassar essa responsabilidade para os pacientes que tomarem a vacina. No entanto, os países que já começaram a aplicar a vacina da Pfizer em massa, como os Estados Unidos e Reino Unido, não estão exigindo nada parecido de suas populações.
“O termo jurídico é consentimento informado. Então a pessoa [imunizada] sabe que vai estar tomando uma vacina que foi feita a primeira, segunda e terceira fase, mas que não foi um estudo tão aprofundando como outras vacinas que nós conhecemos na história”, disse Zuliani, segundo o jornal Folha de S.Paulo. “E que eventualmente pode ter algumas reações que não dará para a União assumir esse passivo ao longo das próximas décadas, que uma vacina possa trazer de efeito colateral.”
A medida deve ser incluída na MP que autoriza a adesão do Brasil a um plano global para a aquisição de vacinas contra o novo coronavírus, a Covax Facility. A previsão é que o texto seja assinado ainda nesta terça pelo presidente.
Na segunda-feira, Bolsonaro, falando com apoiadores em frente ao Palácio do Alvorada, já havia citado a exigência do termo de responsabiilidade. Ele também voltou a repetir que é contra uma vacina obrigatória e sugeriu, sem provas, que a vacina pode ser potencialmente perigosa para idosos.
“Vocês vão ter que assinar o termo de responsabilidade, se quiserem tomar. A Pfizer é bem clara no contrato: ‘Não nos responsabilizamos por efeito colateral’. Tem gente que quer tomar, então toma. A responsabilidade é sua. Para quem está bem fisicamente, não tem que ter muita preocupação. A preocupação é o idoso, quem tem doença”, disse Bolsonaro.
Críticas
Ouvidos pelo G1, o diretor-executivo do Instituto Questão de Ciência (IQC), Paulo Almeida, a epidemiologista Carla Domingues e a professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Ethel Maciel criticaram o plano do presidente.
“Primeiro porque isso não é necessário desde que a vacina tenha aprovação, seja extraordinária, seja regular de registro de autoridades sanitárias competentes. E, segundo, porque isso, em última instância, vai diminuir a cobertura vacinal em função da pessoa que, quando for à UBS tomar a sua vacina, tenha que assinar um termo”, disse Almeida.
“Não justifica no programa de vacinação pedir um termo de consentimento. Parece que o presidente não quer que a vacina aconteça no nosso país. Ele está jogando contra a população que quer buscar a vacinação”, afirmou Domingues.
“Esse termo de responsabilidade não faz sentido. Cria uma barreira para que as pessoas possam ir se vacinar; cria uma suspeita no momento que a gente precisa dar segurança às pessoas. A Anvisa só vai aprovar um produto que seja seguro e eficaz”, disse Maciel.
Ainda segundo o G1, ministros do STF apontaram que a medida deve ser derrubada pelo tribunal. Os ministros ouvidos pelo site apontam que, se uma vacina aplicada no Brasil for autorizada pela Anvisa, não faz nenhum sentido exigir esse termo de responsabilidade.
Ofensiva
Nas últimas semanas, Bolsonaro, que minimizou o coronavírus ao longo da pandemia e promoveu curas sem embasamento científico, passou a politizar a vacina. A atitude ficou evidentena sua ofensiva contra a Coronavac, a vacina promovida pelo governador de São Paulo, um desafeto do presidente.
Bolsonaro chegou até mesmo a celebrar publicamente a interrupção temporária dos testes da Coronavac em novembro, após a morte de um voluntário, em circunstâncias não relacionados ao experimento. No final de novembro, Bolsonaro também disse que não pretende tomar a vacina. A pandemia já deixou mais de 180 mil mortos no Brasil.
A Coronovac está na fase final de testes. A atitude do governo federal vem levantando o temor de que a Anvisa, agência reguladora federal responsável por aprovar o uso de vacinas, sofra interferência de Bolsonaro e atrase o processo de autorização. Nos últimos meses, redes bolsonaristas têm chamado a Coronavac, que começou a ser produzida no Brasil pelo Instituto Butantan, ligado ao governo paulista, de “vachina” e espalhado mentiras delirantes sobre o imunizante ser um mecanismo disfarçado de controle da mente.
A ofensiva parece ter gerado efeito. Segundo o Datafolha, cresceu o percentual de brasileiros que não querem tomar vacina contra a covid-19. Eram 9% em agosto. Agora são 22%.
O governo Bolsonaro também vem sendo criticado pela lentidão em elaborar um plano eficiente de imunização nacional. Uma espécie de rascunho foi apresentado no último fim de semana. O documento não indica uma data de início da vacinação e inclui como “garantidas” vacinas que ainda dependem de negociações. Vários cientistas foram mencionados no texto como colaboradores, mas eles logo afirmaram que nunca haviam visto o documento. O plano ainda tinha omissões chamativas, como a falta de previsão de medidas para evitar contaminação nos locais de imunização.
Fonte: Deutsche Welle