Enquanto a situação em áreas devastadas pelas piores inundações em décadas no oeste da Alemanha se acalma, intensifica-se no país o debate político sobre as consequências da catástrofe em termos de proteção contra as mudanças climáticas e desastres do tipo. O número de mortos na tragédia passou de 160 nesta segunda-feira (19/07).
Os esforços para encontrar mais vítimas e limpar o rastro de destruição deixado pelas enchentes – que atingiram não apenas o oeste da Alemanha, mas também o leste da Bélgica e a Holanda – continuam nesta segunda. Na Alemanha, os estados da Renânia-Palatinado e da Renânia do Norte-Vestfália foram os mais atingidos.
Em meio a críticas às medidas para proteger a população, políticos defenderam os preparativos para enchentes, embora muitos tenham reconhecido que precisarão aprender com as lições deixadas pela tragédia.
As chuvas torrenciais que fizeram com que rios transbordassem rapidamente na última quarta-feira haviam sido previstas, mas aparentemente alertas sobre os potenciais danos catastróficos não chegaram a muitas pessoas.
“Assim que fornecermos a ajuda imediata, teremos que analisar: houve coisas que não funcionaram bem? Houve coisas que deram errado? Então, elas precisariam ser corrigidas”, disse o ministro da Economia, Peter Altmaier, ao jornal Bild. “Não se trata de apontar culpados, se trata de melhorias para o futuro.”
Ministro do Interior rebate críticas
O vice-líder da bancada do oposicionista Partido Liberal Democrático (FDP) no Bundestag (Parlamento alemão), Michael Theurer, afirmou em entrevista à agência de notícias DPA que o elevado número de mortos revela uma “falha significativa do sistema”, pela qual o ministro do interior do país, Horst Seehofer, seria responsável.
A líder do partido A Esquerda, também de oposição, Susanne Hennig-Wellsow, chegou a pedir a renúncia do ministro.
Seehofer rebateu as críticas. “Seria completamente inconcebível que uma catástrofe como essa fosse administrada centralmente. É preciso conhecimento local”, disse o ministro a jornalistas nesta segunda.
Seehofer afirmou que alertas são emitidos aos 16 estados do país, onde distritos e comunidades decidem em nível local como responder. “Não é Berlim que declara estado de emergência, isso é feito localmente”, disse, ressaltando que canais de comunicação pelos quais o governo federal é responsável funcionaram.
O chefe da agência de proteção civil alemã (BBK, na sigla em alemão), Armin Schuster, afirmou que o serviço meteorológico “previu relativamente bem” e que o país estava bem preparado para inundações de seus principais rios. No entanto, Schuster afirmou à emissora ZDF neste domingo que o problema é que “meia hora antes, muitas vezes não se sabe que lugar será atingido por que volume de chuva”.
Ele afirmou que a BBK enviou 150 alertas por meio de aplicativos e da mídia. Ao mesmo tempo, apontou que ainda não é possível dizer em que locais as pessoas foram alertadas por meio de sistemas de sirenes e que isso ainda será apurado. No momento, porém, é hora de se concentrar nos esforços de resgate e ajuda aos atingidos, disse.
Schuster disse ser necessário manter um sistema misto de alerta, com alertas digitais e sirenes. Segundo ele, um programa de 90 milhões de euros deveria permitir que sirenes fossem instaladas “nos locais adequados” pelo país, mas o valor não será suficiente. “É um projeto para vários anos”, afirmou.
Autoridades no estado alemão mais atingido, a Renânia-Palatinado, afirmaram que estavam bem preparadas para enchentes e que municípios haviam sido alertados e agiram. Mas, em visita com a chanceler federal Angela Merkel ao duramente atingido vilarejo de Schuld, o secretário do Interior do estado, Roger Lewentz, afirmou: “Obviamente tivemos o problema de que a infraestrutura técnica, como eletricidade, foi destruída de uma só vez.”
Autoridades locais tentaram reagir rapidamente, disse Lewentz. “Mas foi uma explosão de água em instantes. Você pode ter os melhores preparativos e sistemas de alerta, mas se o equipamento de alerta é destruído e arrastado junto com construções, então a situação é muito difícil.”
“A proteção climática não é uma questão ideológica”
Nesta segunda, a candidata a chanceler federal pelo Partido Verde, Annalena Baerbock, defendeu que o governo federal desempenhe um papel maior de coordenação em catástrofes como inundações e incêndios florestais.
“O segundo ponto é que precisamos de medidas de adaptação ao clima”, disse a candidata no programa televiso Morgenmagazin.
Sobre a proteção da população, Baerbock afirmou à revista Der Spiegel: “Ajuda só funciona quando tudo está interligado. Para isso, é necessária uma instância que congregue todas as forças, que reúna o mais rápido possível helicópteros ou equipamentos especiais de toda a Alemanha ou de países vizinhos da União Europeia.”
A candidata também defendeu que os sistemas de alerta sejam melhorados, que cidades passem por reformas e que rios tenham mais espaço para fluir. “Não se trata de decidir entre precaução climática, adaptação climática e proteção climática, mas de uma tríade, que está prevista em todos os tratados de proteção climática mundo afora.”
Também o governador da Baviera e chefe da União Social Cristã (CSU), Markus Söder, defendeu mais medidas e financiamento contra as mudanças climáticas. Para ele, a proteção climática não é uma questão ideológica, mas uma questão de razão e ética. Trata-se de proteger mais a Alemanha e de pensar em que mundo se quer deixar para filhos e netos, disse.
Ao visitar a pequena cidade de Schuld no domingo, Merkel afirmou que as autoridades trabalharão para “consertar” tudo “nesta bela região, passo a passo” e que seu governo vai aprovar um programa de ajuda estatal imediata na próxima semana.
O ministro das Finanças, Olaf Scholz, disse ao jornal Bild am Sonntag que mais de 300 milhões de euros (R$ 1,8 bilhão) serão necessários imediatamente. Segundo Scholz, o custo total de reconstrução, considerando enchentes anteriores, deve ficar na casa dos bilhões de euros.
“Felizmente, a Alemanha é um país que pode administrar isso financeiramente”, disse Merkel, que deve deixar o cargo em setembro, após quase 16 anos. “A Alemanha é um país forte e vamos enfrentar essa força da natureza no curto prazo – mas também no médio e longo prazo, por meio de uma política que preste mais atenção à natureza e ao clima do que fizemos nos últimos anos”, disse a chanceler federal.
Fonte: Deutsche Welle