Quatro em cada 100 pessoas no país vivem em áreas suscetíveis a deslizamentos, inundações e enxurradas. Chuvas fortes já castigaram Bahia e Minas Gerais e poderão causar mais estragos no Norte e Nordeste neste verão.
A estação mal começou, e chuvas de verão já causaram desastres pelo Brasil, enquanto, ao mesmo tempo, várias regiões sofrem com estiagem.
Em Minas Gerais, mais de 17 mil pessoas estão desalojadas e outras seis morreram por causa das chuvas fortes que atingem praticamente todo o estado, de acordo com boletim da Defesa Civil de Minas Gerais divulgado nesta segunda-feira (10/01). O órgão não considera nesta conta, até o momento, os dez mortos no acidente em Capitólio, onde uma placa rochosa se desprendeu e atingiu dezenas de pessoas no último sábado.
Apesar de não serem esperadas para o Nordeste neste período, precipitações também castigaram a Bahia. Mais de 850 mil pessoas foram afetadas, 26 morreram e duas estão desaparecidas, segundo a Defesa Civil estadual.
O secretário nacional de Proteção e Defesa Civil, coronel Alexandre Lucas Alves, aponta que pelo menos quatro municípios baianos – Vitória da Conquista, Teofilândia, Ruy Barbosa e Feira de Santana – estavam em situação de emergência por causa de estiagem quando foram atingidos pela água.
“A região afetada pelas chuvas [na Bahia] é caracterizada por intensa estiagem”, afirma Alves. Ele explica que as chuvas são esperadas no estado somente entre março e junho.
“O estado praticamente não tem referência para lidar com esse tipo de desastre natural, não tinha um preparo. A maior parte das cidades afetadas nunca teve esse tipo de evento”, diz o secretário nacional.
O mesmo ocorreu em Minas Gerais, onde pelo menos quatro municípios que sofrem com os desastres causados pelas chuvas este mês – Almenara, Rio do Prado, Ponto dos Volantes e Bertópolis – também tinham decreto de estiagem para o período.
“Estes são apenas alguns exemplos de municípios que estão em situação de emergência tanto pelo desastre decorrente das chuvas quanto pela estiagem”, diz o secretário nacional da Defesa Civil.
O Brasil não tem dados oficiais sobre as cidades mais vulneráveis à ocorrência de desastres naturais de grande porte, mas o Serviço Geológico Brasileiro monitora áreas consideradas propensas a desabamentos, inundações, deslizamentos de rochas, etc. Atualmente, o Serviço considera que 1.601 cidades têm “alto e muito alto risco” de deslizamentos de terra, inundações, enxurradas e queda de rochas, o equivalente a 28,74% do território brasileiro.
“O Brasil é marcado por desastres naturais entre novembro e abril por conta do período chuvoso, quando ocorrem grandes acumulados pluviométricos distribuídos sobretudo entre as Regiões Norte, Centro Oeste e Sudeste”, aponta o coordenador-geral substituto de Operação e Modelagem do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), Giovanni Dolif.
Quatro a cada 100 brasileiros vivem em áreas expostas
Os impactos de um desastre natural dependem, além da magnitude do fenômeno, da vulnerabilidade do local e da exposição de bens e pessoas ao desastre. Por isso, um desastre com menor magnitude, porém ocorrido em áreas de populações mais vulneráveis, pode causar mais danos.
Apesar de não se poder comparar os eventos, Alves ressalta que as chuvas causaram mais mortes na Bahia, estado que não está acostumado a esse tipo de evento, do que em Minas Gerais.
“Não tem como comparar os impactos dos desastres, porque, além da realidade geográfica de cada local, a estrutura das Defesas Civis muda regionalmente. O Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, por exemplo, tem 8 mil bombeiros e seis helicópteros. Já o da Bahia tem 2 mil bombeiros e nenhum helicóptero”, diz.
De acordo com o Cemaden, mais de 8,2 milhões de pessoas distribuídas em 825 municípios vivem expostas ao risco de deslizamentos, inundações e enxurradas. A maioria delas vive no Sudeste: enquanto, na média nacional, quatro a cada 100 brasileiros vivem em áreas expostas, o número salta para dez a cada 100 no Sudeste.
Um estudo inédito do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) publicado em 2019 mostrou que as áreas mais suscetíveis a deslizamentos estão no Sudeste (23,2% da área têm suscetibilidade muito alta a deslizamento) e Sul (15,6% da área têm suscetibilidade muito alta a deslizamento). A publicação também mostrou que:
- Rio de Janeiro, Espírito Santo e Santa Catarina são os estados mais suscetíveis a deslizamentos: 53,9% do Rio de Janeiro tem suscetibilidade classificada como muito alta, seguido por Espírito Santo (44,9%) e Santa Catarina (33,7%);
- 5,7% do território nacional tem suscetibilidade “muito alta” a deslizamentos;
- 10,4% do território nacional tem “alta suscetibilidade” a deslizamentos.
“As áreas mais suscetíveis a deslizamentos concentram-se em zonas de alta declividade, como os relevos serranos, e com climas capazes de gerar altos acumulados de chuvas em pouco tempo. Já as grandes inundações ocorrem em planícies fluviais”, explica Dolif.
Como será o verão de 2022
Para a segunda semana de 2022, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) já emitiu dois avisos meteorológicos classificados como “de grande perigo (vermelho)” para Goiás, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Por outro lado, também há estiagem em parte do país.
“Enquanto temos seca no Sul, cidades do Maranhão estão alagadas. O Brasil é um país de dimensões continentais”, comenta Alves.
A pedido da DW Brasil, o Cemaden informou que os monitoramentos já apontam que o volume de chuvas ficará acima da média entre fevereiro e abril no Norte e Nordeste, além do Sudeste.
“Para o trimestre em questão, há maior probabilidade de que as chuvas nas regiões Norte e Nordeste estejam acima da média histórica para o período. Estas regiões estarão em maior risco, sobretudo o Sudeste, devido à quantidade de pessoas expostas, vivendo em áreas de risco”, afirma Dolif.
Questionado sobre as medidas de prevenção da Defesa Civil aos possíveis desastres que poderão acontecer no Norte e Nordeste neste trimestre, dada a previsão de chuvas acima da média, o secretário Alves afirma que o foco da ação precisa estar nos municípios.
“Não tem condição de o governo federal, de Brasília, fazer a prevenção de todo o país. O foco precisa estar nos municípios. É preciso que cada cidade tenha uma Defesa Civil forte. É por isso que, no ano passado, demos um treinamento para cada estado, considerando as características de cada um, para ensinar prevenção, mitigação e recuperação de desastres”, diz Alves.
O Cemaden já emitiu 70 alertas de riscos até o dia 7 de janeiro e monitora com prioridade 959 municípios com histórico de desastres naturais registrados entre novembro e abril. Nos últimos três anos, o órgão emitiu 2.722 alertas em 2021; 3.579 alertas em 2020 (ano com volume de chuvas acima da média); 2.192 alertas em 2019.
O que fazer em alagamentos
Em caso de alagamento, a Defesa Civil orienta que a população que mora em áreas de risco deve, entre outras medidas:
- desligar os aparelhos elétricos, o quadro geral de energia e fechar o registro de entrada de água;
- montar um kit com água potável, roupas e remédios, caso tenha que sair rápido de sua casa;
- separar lanternas e pilhas em condições de uso. Não usar velas ou lamparinas devido ao risco de incêndio;
- nunca atravessar pontes, ruas ou avenidas alagadas, mesmo estando de carro, moto ou bicicleta;
- evitar contato com a água de alagamentos, pois pode estar contaminada e provocar doenças.
Após as chuvas, os moradores de casas afetadas precisam lavar o chão, desinfetar o local e procurar por trincas e estufamentos nas paredes, para verificar se a construção não corre risco de desabar. Bebidas e alimentos que tiveram contato com a água de alagamento devem ser descartados.
Fonte: Deutsche Welle