Pesquisadores da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) analisaram como a identificação genética dos tubarões pode ser uma metodologia chave na conservação das espécies, atualmente muito impactadas pelas atividades humanas.
Os tubarões existem na Terra a cerca de 420 milhões de anos, um tempo extraordinário comparado aos aproximadamente 300 mil anos do Homo sapiens (ser humano moderno). Como verdadeiros especialistas, sobreviveram a cinco extinções em massa, sendo a última a que extinguiu os dinossauros. Agora, enfrentam uma nova ameaça, os contínuos impactos diretos e indiretos do ser humano ao meio ambiente.
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Além de sua antiga história evolutiva, esses animais incríveis são essenciais para a conservação dos ecossistemas, desempenhando uma série de funções para a natureza, com destaque as seguintes:
- Manutenção das cadeias alimentares: Os tubarões atuam equilibrando as populações de presas, que por sua vez, exercem também uma função dentro da cadeia alimentar;
- Presas saudáveis: Mantem a população de presas saudáveis, se alimentando de animais mais debilitados, feridos ou doentes;
- Presas com melhores condições genéticas: Ao se alimentarem de indivíduos debilitados, a população daquela espécie mantém os animais com condições genéticas e de adaptação melhores – passando este gene adiante.
Apesar dos benefícios, os tubarões sofrem uma grande pressão humana e vem apresentando indícios do impacto em suas populações. Segundo a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), foi identificada em 2016 a pesca de 770 mil toneladas de tubarões capturados no mundo, além de raias e quimeras.
A cruel prática do finning
A prática do finning, consiste em capturar o tubarão, retirar a nadadeira – e devolvê-lo ao mar mutilado. A nadadeira dos tubarões é muito cobiçada em mercados asiáticos, devido a associação de poderes afrodisíacos e representação de status social.
Estima-se que cerca de 100 milhões de tubarões são mortos anualmente dentro deste mercado, e não se engane, esta prática mesmo sendo ilegal ocorre em águas brasileiras.
Segundo o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, estas são algumas espécies de tubarões com grau de ameaça encontradas no Brasil:
- Carcharhinus longimanus tubarão-galha-branca;
- Carcharhinus obscurus cação-fidalgo, machote, cação-baía, cabeça-chata do sul;
- Carcharhinus perezi tubarão-dos-recifes, tubarão-caribenho-dos-recifes;
- Carcharhinus plumbeus tubarão-galhudo, tubarão-sucuri;
- Carcharhinus porosus cação-azeiteiro, cação rabo-fino (região nordeste), tubarão-junteiro (MA);
- Carcharhinus signatus cação-noturno, tubarão-toninha, machote;
- Alopias superciliosus tubarão raposa;
- Sphyrna lewini tubarão martelo.
Dentro desta temática, um dos principais obstáculos em identificar as espécies que estão sendo mais impactadas pela prática do finning – e se as mesmas estão com algum grau de ameaça de extinção – se deve ao fato dos animais serem encontrados fragmentados, impossibilitando toda esta análise.
Identificação genética como metodologia chave para a conservação dos tubarões
O Prof. Dr. Alexandre W.S. Hilsdorf, que liderou a pesquisa sobre a identificação genética em tubarões, do Núcleo Integrado de Biotecnologia da Universidade de Mogi das Cruzes, explica como esta metodologia pode ajudar a entender mais sobre as espécies capturadas na prática do finning.
“O desembarque de tubarões ao redor do mundo é realizado com animais já processados a bordo da frota pesqueira. Esse processamento consiste em retirar as nadadeiras (para venda em separado) e a cabeça. Desta forma, torna-se impossível identificar a espécie que se está pescando. Muitas dessas espécies estão ameaçadas e são protegidas por leis. Para monitoramento da pesca de tubarões e sua sustentabilidade é vital que se tenha informações sobre quais espécies estão sendo desembarcadas nos portos pesqueiros. A genética auxilia nessa tarefa com a identificação por meio do sequenciamento do DNA dos tubarões desembarcados.”
Para esta identificação por meio dos genes, pode-se utilizar uma série de técnicas de sequenciamento de DNA, uma delas é por meio do DNA mitocondrial: “Ao se sequenciar tais regiões pode-se avaliar por meio de bancos de dados qual a espécie a sequência pertence. Usa-se para isso, uma sequência específica do gene Citocromo Oxidase I do DNA mitocondrial. As sequências parciais desse gene de milhares de espécies estão depositadas em um banco de dados chamado BarCoding of Life”, disse o professor Dr. Alexandre ao Ambientebrasil.
E a partir destas metodologias, é possível atribuir por exemplo, a probabilidade de qual população o indivíduo pertencia, identificar os limites geográficos de migração e até mesmo verificar onde os tubarões foram capturados.
A identificação genética portanto, pode auxiliar não apenas no melhor entendimento quanto as principais espécies capturadas na prática do finning, como também pode prover uma análise global sobre a conservação dos tubarões, contribuindo para a formulação de políticas públicas mais sustentáveis.
“A pesca de tubarões principalmente para retirada de nadadeiras é hoje um comércio sem precedentes, com o aumento cada vez maior da pesca desses animais. Tubarões são animais primordiais para o equilíbrio dos oceanos cumprindo um papel vital para sustentabilidade de todas as espécies marinhas. A pesca desenfreada pode levar populações e mesmo espécies de tubarões à extinção com efeitos sem precedentes para vida marinha. A identificação e controle da pesca de tubarões por meio dos órgãos governamentais é basilar para que as populações dessas espécies possam se recuperar e a pesca possa ser realizada de forma sustentável. Face as dificuldades de identificação morfológicas das espécies desembarcadas a implantação de avaliações genéticas sistemáticas é um passo importante para o controle de ações criminosas de pesca ilegal”, destaca o professor Dr. Alexandre.
Em paralelo a diminuição da população de tubarões, a pressão pesqueira insustentável impacta também na diversidade genética das espécies, que pode levá-las a uma maior sensibilidade a influências externas e até mesmo a extinção.
“Além dos efeitos diversos das ações antrópicas sobre os oceanos, como perda de habitat por poluição, destruição de regiões recifais, entre outras; a sobrepesca pode ser hoje uma das causas mais preponderantes para perda de diversidade genética dentro e entre populações de diversas espécies de tubarões.”
A pesquisa liderada pelo Prof. Dr. Alexandre W.S. Hilsdorf do Núcleo Integrado de Biotecnologia da Universidade de Mogi das Cruzes, em conjunto com a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), foi publicada na Revista Scientific American Brasil.
Redação: Ambientebrasil / Maria Beatriz Ayello Leite
Cooperação: Universidade de Mogi das Cruzes / Prof. Dr. Alexandre W.S. Hilsdorf
Para maiores informações sobre a temática acesse: https://bit.ly/3tU7OFP