Cultivos em algumas regiões da Amazônia começaram ‘há 10 mil anos’

As ilhas florestais desta parte da Bolívia vistas do ar. Fonte: Umberto Lombardo.

Longe de ser um deserto intocado, algumas regiões da Amazônia foram profundamente alteradas por seres humanos que remontam a 10.000 anos, dizem os pesquisadores.

Uma equipe internacional descobriu que, durante esse período, os cultivos estavam sendo realizados em um local remoto no que é agora o norte da Bolívia.

Os cientistas acreditam que os humanos que moravam aqui estavam plantando abóbora, mandioca e milho.

Os habitantes também criaram milhares de ilhas artificiais na floresta.

O fim da última era glacial, há cerca de 12.000 anos, viu um aumento sustentado das temperaturas globais que iniciou muitas mudanças em todo o mundo.

Imagens dos fitólitos encontrados pelos cientistas – a esfera recortada no canto superior direito é de abóbora. Fonte: Umberto Lombardo.

Talvez o mais importante deles tenha sido que as primeiras civilizações começaram a deixar de viver como caçadores-coletores e começaram a cultivar colheitas como alimento.

Pesquisadores já descobriram evidências de que as culturas foram domesticadas em quatro locais importantes em todo o mundo.

Assim, a China vivenciou o cultivo de arroz, enquanto no Oriente Médio eram grãos, na América Central e México era milho, enquanto batatas e quinoa emergiam nos Andes.

Agora, os cientistas dizem que a região de Llanos de Moxos, no sudoeste da Amazônia, deve ser vista como uma quinta região-chave.

A área é uma savana, mas é pontilhada com áreas elevadas de terra, agora cobertas por árvores.

Uma das 4.700 ilhas florestais da região da Amazônia. Fonte: Umberto Lombardo.

A área inunda por parte do ano, mas essas “ilhas florestais” permanecem acima das águas.

Cerca de 4.700 desses pequenos montes foram desenvolvidos por seres humanos ao longo do tempo, de uma maneira bem mundana.

“Estes são apenas lugares onde as pessoas jogam o lixo e, com o tempo, crescem”, disse o principal autor, Dr. Umberto Lombardo, da Universidade de Berna, na Suíça.

“É claro que o lixo é muito rico em nutrientes e, à medida que essas áreas crescem, elas se elevam acima do nível da inundação durante a estação chuvosa, tornando-se um bom lugar para se acomodar em solo fértil, para que as pessoas voltem continuamente para os mesmos lugares.”

Os pesquisadores examinaram cerca de 30 dessas ilhas em busca de evidências de plantio de culturas.

Eles descobriram pequenos fragmentos de sílica chamados fitólitos, descritos como pequenos pedaços de vidro que se formam dentro das células das plantas.

A forma desses pequenos fragmentos de vidro é diferente, dependendo de quais plantas eles se originam.

Os pesquisadores foram capazes de identificar evidências de mandioca cultivadas 10.350 anos atrás. A abóbora aparece 10.250 anos atrás e o milho mais recentemente – apenas 6.850 anos atrás.

“Isso é bastante surpreendente”, disse Lombardo.

Os cientistas trabalhando no local. Fonte: Umberto Lombardo.

“Esta é a Amazônia, é um desses lugares que alguns anos atrás pensávamos ser como uma floresta virgem, um ambiente intocado.”

“Agora estamos descobrindo essa evidência de que as pessoas moravam lá há 10.500 anos atrás e começaram a praticar o cultivo”.

As pessoas que viviam nessa época provavelmente também sobreviveram com batata doce e amendoim, além de peixes e grandes herbívoros.

Os pesquisadores dizem que é provável que os humanos que moraram aqui possam ter trazido suas plantas.

Eles acreditam que o estudo é outro exemplo do impacto global das mudanças ambientais, quando o mundo se aqueceu no final da última era glacial.

“É interessante, pois confirma mais uma vez que a domesticação começa no início do período do Holoceno, quando temos essa mudança climática que vemos ao sair da era do gelo”, disse Lombardo.

“Entramos neste período quente, quando em todo o mundo, ao mesmo tempo, as pessoas começam a cultivar”.

O estudo foi publicado na revista Nature.

Fonte: BBC News / Matt McGrath
Tradução: Redação Ambientebrasil / Maria Beatriz Ayello Leite
Para ler a reportagem original em inglês acesse: https://www.bbc.com/news/science-environment-52217636