Projeto mexicano é exemplo para mercado de carbono

Enquanto o mundo começa a prestar mais atenção ao mercado voluntário de carbono, o site Ecosystem Market Place apresenta um projeto pioneiro, desenvolvido no Sul do México. O projeto utiliza um modelo de desenvolvimento sustentável para produzir e vender ‘reduções’ de carbono há mais de dez anos.

No dialeto Tzeltal, Scolel Té significa a árvore que cresce. De acordo com as pessoas envolvidas, esta frase cabe perfeitamente ao projeto de seqüestro de carbono desenvolvido em Chiapas, México.

Scolel Te utiliza a venda de créditos de carbono na bolsa voluntária de Chicago (CCX – Chicago Climate Exchange) para financiar esforços agroflorestais que reduzem as emissões de gases do efeito estufa, enquanto atinge o desenvolvimento sustentável. Desde o seu lançamento em 1994, o projeto expandiu de Chiapas até Oaxaca, e agora é um negócio viável, envolvendo mais de 400 fazendeiros de 30 comunidades diferentes e uma série de ecossistemas.

O projeto, gerido em conjunto pelo ‘Edinburgh Centre for Carbon Management’ (ECCM) e por uma cooperativa de agrônomos e produtores florestais, conhecida no México como AMBIO, procura compradores interessados em créditos de carbono por razões além do simples cumprimento das suas metas de redução, conectando-os aos fazendeiros que desejam vender os créditos de carbono gerados pelo uso de práticas inovadoras em suas terras.

Em um mercado onde muitos acreditam que reduções custo-efetivas das emissões de gases o efeito estufa e desenvolvimento sustentável em áreas rurais empobrecidas não andam de mãos dadas, o sucesso de Scolel Te é notável.

Mas pesquisadores Mexicanos e Ingleses que trabalham com os fazendeiros indígenas no projeto dizem que o segredo do seu sucesso é surpreendentemente básico: em vez de passar as principais responsabilidades para pessoas de fora, o projeto dá ênfase para a participação dos membros da comunidade.

“A principal força deste projeto é a participação social”, diz o chefe do Laboratório de Informações Geográficas e Estatísticas (Laboratory of Geographical and Statistic Information – LAIGE), Dr. Miguel Angel Castill.

Claro que o projeto não está livre de problemas do mundo real, e Castillo é o primeiro a admitir que trabalhar com as comunidades pobres locais pode ser difícil.

“Aproximadamente 70% das florestas do México estão sob um regime comum de propriedade chamado ‘ejido’, por isso este projeto é dirigido principalmente para os habitantes dos ‘ejidos’. Estas pessoas vivem em áreas com alta riqueza biológica, mas muito pobres”, informa Castillo.

“Trabalhar com pessoas pobres que possuem fortes conflitos sociais implica em altos custos administrativos. Também significa que os procedimentos de gerenciamento consomem tempo, e que é preciso muito esforço para explicar o projeto aos membros da comunidade”.

Apesar disso, Scolel Te parece ter um sistema que satisfaz tanto os fazendeiros indígenas que geram os créditos de carbono quanto as companhias e indivíduos que os compram. Como funciona o sistema? Segundo os envolvidos, tudo se resume a um simples processo:

Passo a passo – O primeiro passo, diz Castillo, é olhar com cuidado a realidade econômica e as prioridades da região na qual se trabalha. E a melhor maneira de verificar a prioridade das pessoas, afirma, é simplesmente perguntar.

Por exemplo, alguns fazendeiros que participavam de um workshop na região de Marqués de Comillas concluíram que “a criação de gado é atualmente a atividade econômica mais importante do ponto de vista das nossas comunidades. Por isso, o seu planejamento deve ser considerado prioridade; assim como a implementação de projetos que reduzam a pressão sobre as áreas florestadas… em um futuro próximo, o florestamento e o agro-florestamento podem se tornar uma das principais atividades. Assim, é compulsório o desenvolvimento de mecanismos que os encorajem”, completa.

Após a primeira fase de avaliação, os fazendeiros participantes do projeto Scolel Té são questionados sobre quais atividades desejam implementar. Com a assistência de promotores locais, eles geram planos (chamados ‘planes vivos’) que se encaixam nas suas necessidades.

“Os ‘planes vivos’ são ferramentas que nos ajudam a planejar e supervisionar o nosso trabalho. Ao mesmo tempo, podemos identificar o lado negativo do nosso sistema produtivo. Os ‘planes vivos’ também nos ajudam a achar alternativas e soluções”, afirmam os fazendeiros.

Se os planos cumprem uma série de especificações apresentadas pelos fazendeiros, técnicos e cientistas, eles são registrados no ‘Fondo BioClimatico’, tornando-se elegíveis para gerar créditos de carbono.

Em Oaxaca, a ONG local ‘Servicios Ambientales de Oaxaca’ colabora com a AMBIO, mas ambas organizações também dependem muito de equipes da comunidade para fazer os trabalhos de campo. “A taxa de abandono é muito baixa. Somente cerca de 2% a 3% dos fazendeiros desistem do projeto. O projeto é sólido, pois é baseado nas prioridades e decisões da população local”, diz a representante legal da AMBIO, Elsa Esquivel.

“A vantagem de manter os membros da comunidade envolvidos no projeto desde o início até o final”, diz o chefe do ECCM, Dr. Richard Tipper, “é que ele permite que os fazendeiros desenvolvam habilidades úteis como mapeamento, planejamento financeiro e silvicultura. E com a ajuda dos membros da comunidade, cada projeto pode funcionar com uma equipe administrativa e técnica pequena, de somente 2 a 4 pessoas.”

Manter baixo o quadro administrativo significa que mais dinheiro pode voltar para os fazendeiros, que são os que mais precisam. Em 2002, por exemplo, o Scolel Té gerou aproximadamente US$180 mil através da venda de créditos de carbono. Do preço da venda, 60% é dirigido aos fazendeiros e à comunidade para a implementação das atividades florestais e 40% é dirigido para o apoio técnico, financeiro, legal e administrativo. A melhoria da qualidade de vida local não é enorme, mas considerável (cada família ganha entre $300 e $1.800 por ano).

Uma maneira de mensurar os possíveis benefícios do projeto (e também os custos) é comparando o potencial lucro da madeira que cresce através do projeto e da produção de milho, a alternativa predominante na região. Uma comparação aproximada destas duas atividades demonstra que o retorno anual de 1 hectare de árvores (800 árvores/hectare) pode ser 1.5 vezes mais alto que o retorno de 1 hectare de milho.

Números – Mesmo com todo o envolvimento local, Esquivel diz que os custos de gerenciamento do projeto podem assustar. “Temos um preço muito bom”. Segundo ela o preço é de US$ 12 a $15 por tonelada de carbono.

“Na verdade deveríamos vender a um preço maior, pois trabalhamos com fazendeiros em pequena escala, com 0.5 a 3 ha no máximo. Assim, os nosso custos administrativos são altos. Mesmo que $15 pareça um bom preço, ele cobre somente os custos dos fazendeiros, e os lucros reais virão quando as árvores crescerem e forem vendidas, mas, em geral, isto leva um longo período. Preços mais altos beneficiariam imediatamente a economia local, encorajando os fazendeiros a continuar com as atividades florestais.”

“Outras organizações”, diz Esquivel, “vendem a tonelada de carbono por $3 a $4, mas alguns deles vêm e vão, enquanto nós representamos permanência no mercado. Estamos vendendo carbono há aproximadamente 10 anos”.

A longa história do Scolel Té no mercado de carbono também permite estimativas mais refinadas da quantidade de carbono ‘seqüestrado’ em cada tipo de uso do solo. As primeiras estimativas dos pesquisadores, por exemplo, eram de que em um período de 25-30 anos (dependendo da espécie de árvore envolvida e das condições locais), a proteção de florestas fechadas geraria 300 toneladas de carbono por hectare.

Por outro lado, a conversão de pastos em plantações de árvores deveria estocar até 120 toneladas por hectare, enquanto o cultivo de frutas e árvores para corte, entremeada com milho e outras plantações anuais deveria seqüestrar 70 toneladas de carbono por hectare. Devido ao fato de que agora o projeto abriga vários terrenos já estabelecidos, pesquisadores da Ecosur estão realizando testes para determinar a precisão destes números. Os primeiros resultados estarão disponíveis em janeiro de 2007.

Por agora, compradores parecem prontos para assumir as estimativas originais. Em 2005, Scolel Té vendeu 10.038 toneladas de reduções de carbono para clientes como a FIA Foundation, o Banco Mundial e a Catedral de Guadalajara. Para 2006, a Fia Foundation já confirmou a compra de 8.300 toneladas de carbono, enquanto a companhia Britânica CarbonNeutral anunciou a compra de 5.090 toneladas do projeto.

Plane Vivo – Para os observadores interessados, o verdadeiro teste do modelo Scolel Té provavelmente será a sua aplicação em outros países. Scolel Té foi o local de testes do sistema ‘Plane Vivo’, um padrão de certificação para reduções desenvolvido pelo ECCM.

Atualmente outros projetos que seguem o sistema ‘Plane Vivo’ estão em operação na Índia, Moçambique e Uganda. (Fernanda Müller/ CarbonoBrasil)