No último dia de atividades da 61ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), na semana passada, em Manaus, o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Gilberto Câmara, chamou a atenção dos participantes da maior reunião científica da América Latina para a necessidade de a comunidade científica nacional empenhar mais esforços na descoberta de números mais exatos sobre os impactos do desmatamento da Amazônia frente às mudanças climáticas.
Ao comparar dados históricos de áreas desmatadas na região com informações sobre a biomassa florestal da floresta amazônica, Câmara criticou os números.
“Esse número de 20% divulgado pelo G8 é um número ‘chutado’ que está rodando pelo mundo. E a ciência brasileira até agora não se deu ao trabalho de checar esse dado. Na década de 1990 eram desmatados na Amazônia em média 22 mil quilômetros quadrados, o que representava cerca de 8% das emissões de CO2 do planeta”, disse ele na ocasião.
“Se o Brasil conseguiu reduzir o desmatamento na região de 27 mil quilômetros quadrados, em 2004, para a média atual que é de 12 mil quilômetros quadrados, a Amazônia deve ser responsável atualmente por menos de 5% das emissões globais, logo o G8 deve estar equivocado e ter se baseado em dados fracos.”
Para ele, os números do G8 podem ser tendenciosos, uma vez que, “no que diz respeito a dados sobre emissões de efeito estufa, é importante dividir o prejuízo”.
“Quanto mais países como o Brasil responderem pelos prejuízos ambientais, menos os países do G8 serão responsáveis. A conta de que 20% das emissões de CO2 do mundo vêm do desmatamento pode não ter base científica”, apontou Câmara.
Outro ponto questionado pelo diretor do Inpe é se vale a pena o Brasil aderir ao REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação florestal, na sigla em inglês), mecanismo por meio do qual os países que reduzem suas taxas de desmatamento poderiam vender créditos de carbono para outras nações.
“Os países desenvolvidos acreditam que o Brasil deve vender o que podemos chamar de ‘carbono virtual’ da floresta, que ainda não foi cortada. Assim, as empresas globais poluidoras que não conseguirem compensar suas emissões poderiam comprar carbono que nunca foi lançado na atmosfera”, explicou.
“Mas será que o Brasil deve vender ar? E, em caso afirmativo, a grande questão é quem deve receber esse dinheiro, os assentados, os fazendeiros ou outras pessoas?”, questionou Câmara.
Para ele, ainda que o Brasil aumente o número de áreas de proteção ambiental e, em contrapartida, não reduza a efetiva demanda da população por terra, o desmatamento provavelmente não será reduzido. “Se um assentado recebe uma quantia para não desmatar em determinada região, por exemplo, esse mesmo cidadão poderá simplesmente continuar desmatando em outra área”, alertou.
Em tese, concluiu o diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, atualmente não há muitas garantias de que se o Brasil receber dinheiro dos países ricos por meio do REDD o desmatamento irá necessariamente diminuir. Pelo contrário, ele pode simplesmente se manter e até aumentar.
“Sem contar que 90% do desmatamento na Amazônia é ilegal e, assim, nós estaríamos pagando para os fora da lei não desmatarem mais. Trata-se de um dinheiro sujo e o país tem mais o que fazer do que aceitar essa proposta. Esse é um debate importante que deverá ser tratado na conferência do clima de Copenhague, no final deste ano”, destacou. (Fonte: Thiago Romero/ Agência Fapesp)