Um grupo de pesquisadores da Alemanha acaba de pôr em números algo que todo mundo já sabia: o Acordo de Copenhague é incapaz de manter o aquecimento global em 2ºC, seu objetivo declarado. Na verdade, argumentam, ele pode produzir o efeito inverso: fazer as emissões globais subirem e com elas os termômetros.
A conta foi feita por Joeri Rogelj, Malte Meinshausen e colegas, do Instituto de Pesquisa de Impactos Climáticos de Potsdam, e publicada na edição de hoje do periódico “Nature”.
Os cientistas se basearam nas promessas de corte de emissões feitas até o último dia 13 por 76 países que aderiram ao acordo, produzido na cúpula do clima de dezembro passado.
A conferência na Dinamarca terminou sem um acordo global e legalmente vinculante de corte de emissões de gases-estufa para o período 2013-2020. Produziu um documento frouxo, sem metas de longo prazo, no qual os países anotariam seus compromissos voluntários de redução para 2020.
“Como não sabíamos que propostas os países inscreveriam, não tínhamos como saber qual seria o nível real de ambição do Acordo de Copenhague”, disse Meinshausen à Folha. “Sabemos agora, e ele calha de ser inadequado para cumprir a meta de 2ºC.”
Os alemães inseriram os valores mínimos e máximos das propostas num modelo computacional de resposta do clima a emissões de origem humana.
A conclusão é que, se o acordo for seguido, o mundo chegará a 2020 com emissões anuais de 47,9 bilhões a 53,6 bilhões de toneladas de gás carbônico equivalente (a soma das emissões de todos os gases-estufa “convertidas” em COº2).
No entanto, para ter uma chance igual ou maior do que 50% de manter o aquecimento num máximo de 2ºC -nível considerado seguro, as emissões anuais máximas teriam de ser de 44 bilhões de toneladas.
Deixa que eu deixo
A trajetória insustentável do acordo se coloca por duas razões. Primeiro, o voluntarismo do texto faz os países inscreverem como metas aquilo que demanda o menor esforço. Japão e Noruega são os únicos países ricos que apresentaram propostas nos valores recomendados pelo IPCC (painel do clima da ONU), de corte de 25% a 40% no CO2 em relação aos níveis de emissão de 1990.
Depois, por sua natureza jurídica frouxa, o acordo não proíbe o uso de créditos de carbono em excesso gerados pelo Protocolo de Kyoto. Meinshausen estima que haja 12 bilhões de toneladas de gás carbônico em créditos “ocos”, ou seja, que não corresponderam a um esforço de redução de emissões -são apenas um truque contábil de Kyoto para facilitar o cumprimento das metas.
O modelo dos alemães estima que esses “buracos” no acordo dão uma chance maior do que 50% de que o aquecimento ultrapasse os 3ºC em 2100. “Se nos próximos dez anos o Acordo de Copenhague for tudo o que temos, então teremos travado o mundo numa trajetória de emissões relativamente alta até lá”, diz Meinshausen. “Emitir 48 bilhões de toneladas de CO2 equivalente em 2020 é o mesmo que correr na direção de um penhasco e torcer para parar na beirinha.” (Fonte: Claudio Angelo/ Folha Online)