Uma das maiores ameaças à vida marinha, a acidificação dos oceanos será alvo de um novo centro das Nações Unidas a ser instalado em Mônaco. O Centro de Coordenação Internacional da Acidificação dos Oceanos funcionará nos laboratórios ambientais da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) com o objetivo de promover a integração e comunicação das ações globais sobre o tema. O anúncio foi feito na semana passada, durante a Conferência da ONU para o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20). “Com o novo centro, teremos a chance de tirar mais proveito das pesquisas nacionais para poder enfrentar com mais eficiência o problema global da acidificação”, afirma Daud bin Mohamad, vice-diretor de Pesquisa Nuclear da AIEA que vai chefiar o órgão.
Resultado do aumento da concentração de dióxido de carbono na atmosfera, a acidificação pode tornar muitas regiões dos oceanos desertos marinhos até 2050. Como consequência direta do aumento das emissões, no último século o pH (medida de acidez ou alcalinidade) médio dos oceanos baixou de 8,2 para 8,1. Embora a mudança pareça pequena, ela indica que a água do mar ficou 30% mais ácida no período. E como os oceanos absorvem até um terço do CO2 lançado na atmosfera, a expectativa do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU é de que seu pH baixe em mais 0,3 nas próximas décadas, atingindo 7,8 até o fim deste século. Apesar disso, o problema foi durante muito tempo ignorado nas discussões sobre redução das emissões.
“Os mares são o maior e mais importante depósito de carbono do planeta”, diz Nicolas Gruber, do Instituto de Biogeoquímica da Universidade de Zurique, que acaba de publicar na revista “Science” um estudo sobre os efeitos da acidificação dos oceanos no sistema ecológico global. “O CO2 influencia a composição química dos oceanos. Ele se dissolve na água do mar, aumenta o seu grau de acidez e reduz o conteúdo de saturação de carbonato de cálcio, o que tem o efeito de diluir o calcário já existente. Levando em conta o aumento contínuo das emissões nos últimos anos, as mudanças no sistema ecológico já são previsíveis. É difícil ser otimista.”
Gruber analisou a acidificação do mar na Costa Oeste dos Estados Unidos, com projeções sobre mudanças até o ano de 2050. As previsões revelam que, mesmo com um cenário otimista, haverá uma redução do conteúdo de carbonato de cálcio das águas, o que tornará a vida para a flora e fauna marítimas mais adversa.
Atualmente, os primeiros 200 metros de profundidade do oceano da região são saturados de carbonato, mas em 30 anos saturação igual será registrada apenas nos primeiros 60 metros sob a superfície, o que significa que a parte mais fértil em vida do oceano será mais afetada.
Com menos calcário na água, corais, moluscos, crustáceos e outros animais marinhos que desenvolvem conchas enfrentam problemas para se desenvolverem e podem até desaparecer. A maior acidez também afeta os manguezais, maiores produtores de matéria orgânica no mar, e o fitoplâncton, responsável por produzir cerca da metade do oxigênio que respiramos. Além disso, a alteração do pH dos oceanos se dará em um ritmo muito mais veloz do que outras já registradas, a maior dos últimos 55 milhões de anos, não dando tempo para a vida marinha se adaptar às novas condições e ameaçando uma das bases da cadeia alimentar da Terra.
“A velocidade da acidificação pode causar enorme desequilíbrio nos oceanos e, com isso, uma ameaça para a vida marinha”, destaca Gruber.
O economista indiano Pavan Sukhdev, do Departamento de Mercados Globais do Deutsche Bank, fez recentemente uma avaliação das consequências da acidificação dos oceanos para a sociedade. No estudo, ele conclui que só os recifes de corais garantem a sobrevivência de 500 milhões de pessoas no mundo inteiro, com um valor econômico calculado em cerca de US$ 170 bilhões. As previsões são de que até 60% dos recifes de corais, o habitat mais fértil dos oceanos, pois abrigam 25% de todos os animais marinhos, poderão desaparecer nos próximos 20 anos em consequência da acidificação.
“Nos próximos 30 a 40 anos, o crescimento dos corais será menor do que a sua erosão, quer dizer, haverá uma enorme redução dos recifes de corais”, aponta o biólogo Ulf Riebesell, do Instituto de Ciências Marítimas de Kiel, que participou de duas recentes expedições do Greenpeace para estudar a acidificação no Oceano Ártico, um dos mais afetados pelo problema porque a água fria absorve com mais rapidez o CO2.
Nas expedições do Greenpeace, que contaram com a participação de 12 institutos de pesquisa da Europa, os cientistas analisaram de perto os efeitos da acidificação em plantas e animais. Eles verificaram que, com um conteúdo cada vez menor de carbonato de cálcio na água, a concha dos moluscos e a carapaça dos crustáceos tornaram-se porosas. (Fonte: Yahoo)