Os impactos das mudanças climáticas estariam acontecendo “mais rapidamente do que o esperado”? Desde a elevação do nível do mar até eventos naturais extremos, os distúrbios são anunciados há tempos – destacam pesquisadores, que reconhecem, no entanto, que podem ter subestimado a sua magnitude.
Em Incheon, na Coreia do Sul, o grupo de especialistas em clima da ONU (Giec), em reunião com os governos, prepara-se para publicar na próxima segunda-feira (8) o mais recente relatório sobre um aquecimento de 1,5ºC em relação a era pré-industrial, um horizonte muito próximo, em um mundo já atingido pela elevação da temperatura e seus efeitos.
“As coisas que os cientistas previram para o futuro estão acontecendo”, declarou a diretora do Greenpeace International, Jennifer Morgan.
“Pensávamos que tínhamos mais tempo, mas não”, frisou.
“Infelizmente, quase tudo que está acontecendo foi dito há 30 anos”, ressalta o ex-vice-presidente do Giec Jean Jouzel, um pioneiro da glaciologia.
“Este aquecimento que provocaria um aumento dos eventos extremos, é o que vivemos hoje!”, afirmou.
“Há um lado muito triste ver acontecer no mundo real o que a física do clima nos ensina há anos”, acrescenta a climatologista Valerie Masson Delmotte, que é copresidente da reunião atual.
O climatologista Jean-Pascal Ypersele cita o relatório “Um só planeta”, preparado em 1972 para a primeira conferência da ONU sobre o meio ambiente humano, que falava de “efeitos globais e catastróficos” de um possível aumento de 2°C, devido às emissões de CO2.
“Aqueles que subestimaram a severidade da mudança climática são a maioria dos líderes políticos, que pouco agiram por tantos anos”, lamentou o cientista belga, que vê duas razões: “a falta de interesse em questões de longo prazo, e os esforços dos lobbies das indústrias de combustíveis fósseis para incutir dúvidas sobre as análises das mudanças climáticas e suas soluções”.
– Prudência necessária? –
Os cientistas também admitem que, muitas vezes, inclinaram-se para a cautela.
Para Michael Mann, da Universidade Estadual da Pensilvânia, “os modelos de projeção têm sido excessivamente conservadores, com tendência a subestimar os impactos atuais, incluindo a perda de gelo marítimo no Ártico, o gelo na Groenlândia, ou o gelo na Antártica Ocidental e, portanto, a ascensão resultando do nível dos mares”.
“Os modelos também não conseguiram capturar todos os impactos de eventos extremos, como os que atingiram a América do Norte, a Ásia, ou a Europa neste verão”, disse o pesquisador, autor de um estudo que descreve fenômenos no Ártico que foram mal compreendidos pelos modelos.
A incerteza não é nossa amiga. “Quanto mais entendemos os processos físicos, incluindo-os nos modelos, mais vemos que os impactos da mudança climática provavelmente serão mais fortes e mais rápidos do que pensávamos inicialmente”, completou.
O sistema “de estudos científicos, revisados pelos pares, é altamente conservador”, acrescenta o climatologista Peter Frumhoff, atualmente na ONG Union of Concerned Scientists.
“E depois há uma tradição cultural na ciência, e especialmente na ciência do clima, que não quer ser muito alarmista”, lembrou.
Acrescente-se a isso o funcionamento do Giec, que procede por consenso, e cujo papel é indicar quais conclusões científicas são de alto grau de confiança e quais são mais especulativas.
O resumo de seus relatórios, destinados aos tomadores de decisão, é adotado pelos governos, com os quais às vezes é necessário negociar a formulação, como é o caso em Incheon.
Em qualquer caso, “os relatórios do Giec se reforçam um após o outro, mas tudo permanece na continuidade do primeiro”, disse Jean Jouzel, que lista as muitas trilhas para a pesquisa.
Quando se trata, por exemplo, da magnitude da ascensão do mar, “alguns estudos anunciam 80 cm até o final do século, enquanto outros chegam até 3m!”.
Fonte: AFP