As maiores baleias do mundo são mais do que meras maravilhas evolucionárias. Ao remover o carbono do oceano, elas podem ajudar a humanidade a combater as mudanças climáticas – um serviço ecossistêmico que pode valer milhões de dólares por baleia, de acordo com uma nova análise feita por economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Proteger animais grandes e carismáticos, como as baleias, é frequentemente visto como uma espécie de caridade que indivíduos e governos fazem em nome da natureza. Uma equipe de economistas liderada por Ralph Chami, diretor assistente do Instituto de Desenvolvimento de Capacidade do FMI, queria mudar a maneira como pensamos sobre as baleias, quantificando o benefício que eles nos proporcionam em dólares e centavos. Sua nova análise, detalhada em um artigo recente na publicação comercial Finance & Development, é uma tentativa inédita de fazer exatamente isso.
A análise ainda não foi publicada em um artigo científico revisado por estudiosos e ainda existem importantes lacunas no conhecimento científico em termos de quanto carbono as baleias podem capturar. Mas, com base nas pesquisas que foram feitas até agora, fica claro para os economistas que, se protegermos as grandes baleias, teremos grandes dividendos para o planeta.
Chami espera que essa descoberta “inicie um debate entre os criadores de políticas públicas que não apostam em salvar animais para o bem dos animais”.
“Temos que concordar que as baleias são um bem público internacional”, diz ele.
Sumidouro natural de carbono
As grandes baleias, incluindo as que se alimentam por filtração e os cachalotes, ajudam a absorver o carbono de algumas maneiras. Elas armazenam toneladas de carbono em seus corpos gordos e ricos em proteínas e agem como gigantes árvores aquáticas. Quando uma baleia morre e sua carcaça desce para o fundo do oceano, esse carbono armazenado é retirado do ciclo atmosférico por centenas a milhares de anos, um sumidouro de carbono.
Estudo publicado em 2010 estimou que oito tipos de baleias, incluindo baleias azuis, jubarte e minke, coletivamente transportam quase 30 mil toneladas de carbono para o mar profundo a cada ano, à medida que as carcaças afundam. Os autores estimam que, se grandes populações de baleias recuperassem o tamanho que tinham antes da caça comercial, esse sumidouro de carbono aumentaria em 160 mil toneladas por ano.
Enquanto estão vivas, as baleias podem fazer ainda mais para absorver o carbono, graças ao seu excremento do tamanho de um jumbo. As grandes baleias se alimentam de pequenos organismos marinhos como plâncton e krill nas profundezas do oceano antes de emergir para respirar, e fazer cocô e xixi – e as últimas atividades liberam uma enorme quantidade de nutrientes, incluindo nitrogênio, fósforo e ferro, na água. Os chamados poo-namis estimulam o crescimento do fitoplâncton – algas marinhas que retiram carbono do ar através da fotossíntese.
Quando o fitoplâncton morre, grande parte do carbono é reciclado na superfície do oceano. Mas alguns fitoplânctons mortos inevitavelmente afundam, enviando mais carbono para o fundo do mar. Outro estudo de 2010 descobriu que as 12 mil baleias cachalote no Oceano Antártico extraem 200 mil toneladas de carbono da atmosfera por ano, estimulando o crescimento e a morte do fitoplâncton através de suas fezes ricas em ferro.
Não se sabe exatamente quanto cocô de baleia estimula o fitoplâncton em escala global, de acordo com Joe Roman, biólogo da Universidade de Vermont que estuda o fenômeno há anos. É por isso que os economistas adotaram o que Chami descreve como uma abordagem “se, então”, perguntando quanto carbono poderia ser capturado, hipoteticamente, se a população atual de grandes baleias do mundo aumentasse o fitoplâncton marinho em cerca de 1% em todo o mundo. Para isso, eles acrescentaram uma estimativa baseada na literatura de quanto dióxido de carbono as baleias retiram do ambiente quando morrem: cerca de 33 toneladas por carcaça, em média.
Utilizando o atual preço de mercado do dióxido de carbono, os economistas calcularam o valor monetário total dessa captura de carbono de mamíferos marinhos e o adicionaram a outros benefícios econômicos que as grandes baleias proporcionam por meio de ecoturismo.
No total, Chami e seus colegas estimaram que cada um desses gigantes gentis vale cerca de 2 milhões de dólares ao longo de sua vida. E a população global de grandes baleias? Possivelmente, um ativo de um trilhão de dólares para a humanidade.
Nova mentalidade
Hoje existem cerca de 1,3 milhão de grandes baleias nos oceanos da Terra. Se pudéssemos restaurar a população aos seus números anteriores à caça comercial de baleias – entre 4 e 5 milhões – os economistas acreditam que as grandes baleias poderiam capturar cerca de 1,7 bilhão de toneladas de dióxido de carbono por ano. Isso é mais do que as emissões anuais de carbono do Brasil.
No entanto, são apenas alguns por cento dos 40 bilhões de toneladas de dióxido de carbono que a humanidade lança no ar a cada ano. E mesmo com esforços agressivos de conservação global, pode levar décadas até que as grandes baleias retornem ao número anterior às caças, supondo que isso seja possível, considerando o quanto degradamos os oceanos.
“Não queremos exagerar”, disse Steven Lutz, líder do Programa Carbono Azul da GRID-Arendal, uma fundação norueguesa que trabalha com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. “Não é como se bastasse salvar as baleias para salvar o clima”.
Para Lutz, os números exatos apresentados na nova análise são menos significativos do que a estrutura que introduz para pensar em animais selvagens em termos de seu valor quando mantidos vivos. Ele gostaria de ver esse tipo de abordagem aplicada a ecossistemas marinhos ricos em carbono, como leitos de ervas marinhas, e a outros grupos de organismos marinhos, como peixes.
“Vemos o carbono das baleias como potencialmente a ponta do iceberg até o carbono marinho”, diz Lutz.
Talvez uma abordagem de benefícios financeiros possa ser estendida aos animais terrestres. Por exemplo, um estudo recente da Nature Geoscience estimou que os elefantes da floresta na Bacia do Congo ajudam a floresta a absorver bilhões de toneladas de carbono.
Fabio Berzaghi, pesquisador do Laboratório de Ciências Climáticas e Ambientais da França e principal autor do estudo, disse que a análise do FMI levanta um ponto “extremamente importante” sobre os grandes animais: que seus serviços ecossistêmicos “beneficiam a todos”.
“Acho que é um bom primeiro passo para reconhecer que eles fornecem serviços, e esses serviços valem alguma coisa”, disse Berzaghi. “Potencialmente, muito dinheiro.
Fonte: Madeleine Stone National Geographic