Um grupo internacional de cientistas informou nesta segunda-feira (14) ter encontrado moléculas de fosfina na superfície de Vênus, um gás que não é produzido naturalmente na Terra, indicando, assim, que pode existir vida microbiana no planeta vizinho.
A notícia animou a comunidade científica que busca indícios de vida extraterrestre, mas os pesquisadores afirmaram que novos estudos precisam ser realizados na superfície de Vênus para que se comprove que a fosfina encontrada no planeta é produzida pela ação de micróbios.
O astrobiólogo e pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), Douglas Galante, explica que a descoberta é importante, mas lembra que esta não é primeira vez que se descobre fosfina na superfície de um planeta.
“A fosfina já foi encontrada na superfície de Saturno. Depois, os cientistas descobriram que ela é produzida naturalmente lá, e não pela ação de um ser vivo, como acontece na Terra. Agora os cientistas precisam descobrir qual é a fonte da fosfina em Vênus”, explica o astrobiólogo.
“Até hoje, não encontramos nenhuma evidência incontestável de vida extraterrestre. A ciência ainda não comprovou a existência de vida em outros planetas”, diz Galante. “Mas onde tem água e onde tem fonte de energia, a ciência está lá procurando por vida.”
Além da fosfina em Vênus, a ciência fez outras descobertas importantes recentemente, como a descoberta de água em Marte e de condições promissoras em uma lua de Saturno coberta de gelo, a Europa.
“Quando falamos nas apostas de vida fora da Terra, existem pesquisadores que apostam em Marte, assim como existem os que apostam muito mais nas luas geladas de Júpiter e Saturno”, conta Galante, que tem se debruçado sobre as possibilidades do solo marciano.
E não param por aí as apostas. Segundo uma das autoras do estudo que descobriu a fosfina em Vênus, a busca por vida fora da Terra está a todo vapor – seja em Vênus ou em algum dos milhares de planetas que a ciência já descobriu no universo.
“Estamos procurando por sinais de vida em exoplanetas, procurando por gases que não esperamos que estejam lá e há muitas missões em busca de potenciais sinais de vida em nosso Sistema Solar”, informou Sara Seager, professora do MIT.
Água líquida em Europa
Em novembro de 2019, cientistas conseguiram identificar a presença de vapor d’água em Europa, uma das luas de Júpiter. Uma das observações mostrou que o volume de água expelida na forma de vapor seria suficiente para encher uma piscina olímpica em poucos minutos.
Jatos d´água semelhantes também foram detectados jorrando da superfície na lua Enceladus, de Saturno.
“Essas luas [Enceladus e Europa] têm enormes oceanos de água líquida debaixo de uma crosta de gelo, uma espécie de Antártica com um oceano embaixo do seu gelo”, explica Galante, que defende que ambas luas têm condição para a vida microbiana.
O astrônomo Cássio Barbosa explicou à época que a descoberta era animadora, principalmente porque a água encontrada em Europa estava na forma líquida.
“Se alguém quiser detectar vida fora da Terra, deve começar sua procura por locais que tenham água. Não gelo e nem vapor, água líquida mesmo. O motivo é muito simples, a vida como conhecemos se desenvolveu com a água como o meio líquido que, entre outras coisas, intermedeia as trocas de substâncias ao nível celular”, comentou Barbosa.
Vida em Marte?
O queridinho dos filmes e da literatura quando se fala em vida extraterrestre, contudo, ainda é Marte.
Galante lembra que a ciência ainda não comprovou a existência de vida em Marte, mas afirma que a sua fama se deve, principalmente, à sua semelhança com a Terra.
“Marte é o planeta mais próximo da Terra. Ele em uma atmosfera razoável para a vida, mesmo que mais rarefeita, e tem água. Aliás desde os primórdios da astronomia, já se observa na superfície de Marte marcas na forma de rios, de lagos e de oceanos. Ou seja, sabemos que Marte teve água líquida em abundância na superfície no passado”, afirma Galante.
Apesar de não ter sido mais encontrada água líquida na superfície do planeta marciano, ele ainda conserva a água.
“Estudos modernos mostram que existe água na forma de gelo e até água líquida, mas embaixo do solo”, explica o astrobiólogo.
A Agência Espacial Europeia (ESA) enviou neste ano o jipe Rosalind Franklin em uma missão para percorrer a superfície de Marte. Entre outras coisas, o jipe irá procurar por depósitos subterrâneos de gelo (com capacidade de perfuração e aquisição de amostras) e terá um laboratório para identificação de moléculas orgânicas, que podem denunciar a atividade de vida microbiana.
Vale destacar que tanto a missão Curiosity quanto a missão Mars 2020 também têm por objetivo explorar o solo marciano em busca de sinais que evidenciem vida.
Metano e etano em Titã
Titã, uma lua de Saturno, também se tornou de interesse na busca por vida após um estudo publicado no final do ano passado revelar que Titã tem um ciclo hidrológico igual ao da Terra, mas com a diferença que, no lugar da água, o elemento líquido na lua é o metano e o etano.
Segundo os cientistas, um dos pré-requisitos para que a vida surja e se desenvolva é haver um meio líquido. Apesar da vida terrestre ser baseada na água, metano e etano líquidos poderiam servir como meio aquoso para a condição da vida.
“É claro que a vida baseada em hidrocarbonetos líquidos seria muito diferente da vida baseada em água e provavelmente não haveria estruturas muito mais complexas do que seres unicelulares. Ainda assim, seria vida e motivo de todo o interesse da ciência”, explicou Cássio Barbosa em seu blog sobre o estudo de Titã.
Fosfina em Vênus
Vênus já foi considerado um planeta parecido com a Terra, mas a esperança de encontrar vida nele acabou quando se descobriu que sua superfície era a mais quente do Sistema Solar.
“No passado, há 4 bilhões de anos, Vênus teve muito provavelmente condições parecidas com a Terra, mas ele entrou num efeito estufa descontrolado, que aumentou a temperatura da sua superfície até alcançar o extremo. Atualmente, ele é um planeta extremamente quente, com cerca de 450ºC na sua superfície. Por isso, ele era tido como um ‘planeta morto'”, explica Galante.
Com a descoberta de fosfina em sua superfície nesta segunda, a fama de ‘planeta morto’ promete ficar no passado.
Em 2016, a Nasa já havia publicado um estudo levantando a hipótese de que Vênus pode ter tido um clima habitável e água líquida em sua superfície no início de sua existência. Foi neste mesmo ano, aliás, que o grupo de cientistas que descobriu a fosfina em Vênus nesta segunda-feira começou a observar o planeta venusiano em busca de sinais de vida.
Fonte: G1