Talvez você já tenha ouvido falar das “vespas assassinas” ou vespas-mandarinas, que foram manchete internacional depois que um pequeno número foi avistado no noroeste do Pacífico em 2019 e 2020. Atualmente, elas estão confinadas ao extremo noroeste do estado de Washington, Estados Unidos, em parte devido a uma campanha com o intuito de encontrá-las e erradicar seus ninhos.
Mesmo assim, a descoberta desses insetos agressivos, com cinco centímetros de comprimento, conhecidos por dizimar colônias inteiras de abelhas, gerou preocupação nos Estados Unidos, pois muitas pessoas confundiram as vespas locais com as “vespas assassinas”. Na verdade, o que muitas pessoas andam avistando, de acordo com o entomologista Justin Schmidt, da Universidade do Arizona, é uma vespa nativa e inofensiva, mas com um apelido igualmente intimidador: “vespa assassina de cigarras”.
O apelido é apropriado. As fêmeas são grandes, podendo chegar a quase quatro centímetros de comprimento, e se alimentam exclusivamente de cigarras, com as quais lutam durante a predação e, então, injetam seu veneno. Isso paralisa as cigarras, que são carregadas pelas vespas ao voar de volta para suas tocas subterrâneas. Desde meados de julho, as vespas assassinas de cigarras saem de seus abrigos sob a terra e zumbem pelos quintais das pessoas.
As vespas assassinas de cigarras perseguem as cigarras anuais que são mais estáveis, não as espécies periódicas, como a Brood X, do gênero Magicicada, que invadiu o leste dos Estados Unidos em maio. Embora existam quatro espécies de vespas assassinas de cigarras (Sphecius speciosus) na América do Norte, todas têm aparência e comportamento semelhantes.
Apesar de seu tamanho grande e coloração amarela e marrom brilhante, as vespas assassinas de cigarras são inofensivas para os humanos — são “gigantes delicadas do mundo das vespas”, diz Schmidt. Os machos da espécie não picam e, ao contrário das vespas-mandarinas, as assassinas de cigarras fêmeas evitam as pessoas e raramente usam seus ferrões. Uma pessoa teria que manuseá-las para correr perigo, esclarece Schmidt, que recebeu milhares de picadas e, durante o processo, criou a escala de dor Schmidt.
Quando isso acontece, a picada de uma vespa assassina de cigarra é muito leve, quase imperceptível — parece uma simples picada de agulha e dói menos do que a picada de uma abelha halictídea, atraída pelo suor, conta Joe Coelho, ecologista fisiológico da Universidade de Quincy em Illinois que estuda predadores. Para fins de comparação, a picada da vespa-mandarina dói muito mais, é como ser “apunhalado com uma agulha incandescente”, disse o pesquisador Shunichi Makino em uma entrevista anterior.
Mas embora as vespas da espécie Sphecius speciosus sejam “um inseto grande e assustador, elas não fazem nada. Elas não picam as pessoas porque não é da natureza da espécie. É impressionante como as pessoas têm medo delas só por causa da aparência”, indica Coelho.
Anatomia de uma caçada
Para encontrar suas presas bem camufladas, as vespas assassinas de cigarras as procuram nas árvores usando seus grandes olhos e visão aguçada. Ao atacarem, injetam um coquetel de veneno de ação rápida nos insetos, impedindo que as cigarras se movimentem de forma irreversível. Porém, segundo Coelho, ninguém sabe exatamente como isso ocorre. O que se sabe é que o veneno as transforma em uma espécie de zumbis, para que seja mais adequado para alimentar as larvas das vespas. Uma pesquisa feita por um dos ex-alunos de pós-graduação de Coelho mostrou que cigarras envenenadas e paralisadas podem, na verdade, viver mais do que cigarras normais e saudáveis.
Mas, se conseguir mobilizar sua presa, a vespa fêmea precisará voar de volta ao ninho segurando uma cigarra pesada com as patas do meio. A pesquisa de Coelho mostra que as vespas assassinas de cigarras orientais (Sphecius speciosus) realmente conseguem caçar e transportar cigarras com mais de 80% de seu próprio peso — quase duas vezes mais pesadas que elas — o que não deveria ser fisicamente possível. Elas fazem isso, explica Coelho, utilizando uma estratégia: carregam as cigarras para cima de árvores ou outras superfícies verticais e voam vigorosamente em direção ao seu ninho. Essa ação pode se repetir várias vezes, até conseguirem chegar à entrada do ninho, depois disso, ainda têm que arrastar as cigarras pelo subsolo.
De volta ao lar subterrâneo, a fêmea põe um ovo em sua presa imobilizada, que servirá de alimento para as larvas em crescimento. Para produzir filhotes do sexo masculino, as vespas precisam apenas de uma cigarra. Mas as fêmeas, que têm quase o dobro do tamanho dos machos, precisam de duas cigarras para se desenvolverem adequadamente. Quando uma câmara dentro do ninho contém uma ou duas cigarras, a vespa a fecha, faz outra e continua caçando.
Em um bom ano, ela consegue abrir e preencher mais de uma dúzia dessas câmaras; uma única vespa é capaz de caçar e matar mais de 30 cigarras após emergir em meados de julho e morrer cerca de seis semanas depois.
Depois que as larvas de vespas se alimentam das cigarras, elas permanecem no subsolo durante o inverno do Hemisfério Norte e, no meio do verão do ano seguinte, emergem após finalmente terem se desenvolvido por completo como adultos, recomeçando o ciclo.
O blefe da vespa
A maioria das vespas assassinas de cigarras avistadas é, na verdade, machos, que emergem de suas tocas pouco antes das fêmeas a cada verão, explica John Alcock, entomologista da Universidade Estadual do Arizona. Quando as fêmeas aparecem, os machos competem ferozmente para acasalar com uma delas, cada uma das quais procria apenas uma vez. Ao contrário das fêmeas, os machos são agressivos, perseguem e zumbem atrás de animais que se aproximam de seu território, inclusive humanos. Eles chegam ao ponto de fingir uma picada, comportamento denominado falsa ferroada.
Os machos “são muito barulhentos e chamativos, o que deixa as pessoas apavoradas”, comenta Coelho — especialmente porque os insetos parecem preferir habitats movimentados e áreas com terreno aberto e vegetação rasteira, como gramados suburbanos.
No entanto a espécie é um predador crucial no ecossistema, ajudando a manter as populações de cigarras sob controle. Suas incríveis habilidades de caça também fornecem uma lição de história natural fascinante para as crianças, ressalta Schmidt.
“Então, se encontrar algumas vespas assassinas de cigarras em seu quintal, alegre-se em vez de sair correndo para pegar o inseticida”, recomenda Alcock.
Fonte: National Geographic Brasil