Depois de mais de uma década, a seca é fortemente sentida em Ovalle, um vale agrícola ao norte do Chile, onde se vê o avanço do deserto do Atacama, o mais seco do mundo.
O fenômeno da desertificação afeta 21,7% do território chileno, o equivalente a cerca de 16,3 milhões de hectares e 6,8 milhões de pessoas. Mas, aos poucos, são desenvolvidas soluções para mudar essa realidade e garantir que seus habitantes possam continuar vivendo ali.
No alto da reserva ecológica Cerro Grande, 16 painéis de nove metros quadrados cada capturam a neblina que cobre diariamente a área. Em pouco mais de uma década de operação, essa estrutura conseguiu transformar um território caracterizado pela aridez.
Entre os usos da água estão a fabricação de cerveja e a rega de árvores, promovendo regeneração e conservação ecológica do parque. São irrigadas cerca de 1.000 árvores nativas e endêmicas como o quillay, o peumo ou o guayacán, que mudaram a paisagem do lugar. O reaproveitamento é o equivalente a 1.000 a 1.500 litros de água por semana.
Capaz de coletar cerca de 540.000 litros de água por ano, é um dos parques coletores de neblina mais produtivos da América Latina.
“Este é um oásis natural de neblina, como há muitos na costa chilena”, explica à AFP Nicolás Schneider, fundador da Un Alto en el Desierto, fundação que executa e administra o projeto na Reserva Ecológica Cerro Grande de Ovalle.
A tecnologia, projetada no Chile na década de 1960, funciona através de um sistema muito simples: painéis de malha plástica, conhecida como “malha Rachel” e usada na agricultura, conseguem extrair a água condensada no nevoeiro, que cai por gravidade em tanques.
Ocasionalmente, a água também é ingerida por animais que vivem na área e, em situações de emergência hídrica, também abastece as casas da pequena cidade vizinha de Peña Blanca, para lavar roupas ou banheiros.
“Não é possível bebê-la diretamente, porque não passa por processo de purificação”, explica Schneider. Mas um grupo de moradores de Peña Blanca, está desenvolvendo um projeto para tornar a água potável e vendê-la.
Cerveja sustentável
A cerveja Atrapaniebla tem um processo de fabricação semelhante ao de outras bebidas feitas de forma artesanal, embora a utilização deste tipo de água seja seu diferencial no mercado, explica à AFP Miguel Carcuro, um dos proprietários da empresa.
“Com o uso de captadores de neblina conseguimos um produto que incorpora o clima e a geografia deste lugar”, completa.
Só no ano passado foram produzidos 80 mil litros da bebida, atingindo vendas de US$ 186 mil. Os responsáveis por isso? Quatro painéis de captura de neblina, que fornecem entre 2.000 e 3.000 litros por semana, é incorporada diretamente no processo de maceração.
“Alguns degustadores disseram que têm pequenas notas salinas que não encontram em outras cervejas”, acrescenta, destacando a origem marinha do nevoeiro que cobre a reserva ecológica.
Fonte: G1